Quer entender a West Coast Offense? Leia um trecho do Manual do Futebol Americano

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O “Manual do Futebol Americano” e livro escrito por Antony Curti em parceria do Pro Football com a Editora Simonsen. Como o futebol americano ainda é um assunto de nicho no Brasil, é necessário que os leitores e amantes do esporte se juntem para que possamos dar este salto no conhecimento do Futebol Americano no Brasil. Para tanto, estamos com uma campanha de Kickstart (que na prática funciona como uma pré-venda que dá benefícios aos kickadores). Se ela chegar a 100%, com sua ajuda, chegaremos lá wink emoticon

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Nada acontece por acaso na NFL em termos táticos: tudo é uma resposta a algo inovador e arrebatador. Se pudéssemos apontar uma aplicação prática da Terceira Lei de Newton no futebol americano, talvez seja esta. Sempre que um ataque ou uma defesa surge com uma novidade, em algum tempo os ataques ou defesas adversários irão impor uma resistência, uma reação. Foi assim com a Wildcat Offense e a Read-Option mais recentemente – e com os coordenadores defensivos conseguindo anular ambos os conceitos em questão de poucos anos. Mas uma coisa dificilmente é combatida pelas defesas adversárias: o passe perfeito.

O contexto de criação da West Coast Offense – ou melhor, de seu aperfeiçoamento, é também de reação. Ao final da década de 1970 a NFL mudou algumas de suas regras para deixar o jogo mais apelativo ao público. Ou seja, abrindo os ataques, que estavam massivamente terrestres e marcando poucos pontos. Uma dessas inovações, posteriormente nomeada folcloricamente de Mel Blount Rule (em homenagem ao jogador homônimo dos Steelers), proibiu a punição de recebedores ao longo do campo. Agora só era permitido um (e apenas um) contato por parte da defesa e num limite de até cinco jardas da linha de scrimmage. Daí nasce também a falta conhecida como “interferência no passe”. De repente, muda-se o conceito: ao invés de se procurar recebedores físicos no Draft, os técnicos e general managers começaram a procurar pela velocidade e agilidade na posição.

Era o que faltaria para que os conceitos de Bill Walsh começassem a dar certo e se desenvolver. Chamar a filosofia aqui apresentada de West Coast Offense (ou seja, “Ataque da Costa Oeste”, devido ao seu sucesso em San Francisco) pode até ser um erro geográfico. A bem da verdade, os conceitos foram desenvolvidos ao longo da década de 1970 no Cincinnati Bengals. Explicamos; A princípio, porque Paul Brown, o técnico principal (e fundador) dos Bengals era uma das mentes pioneiras do esporte, falando em termos ofensivos. E em segundo lugar, porque a maioria das invenções nasce da necessidade. Na década de 1970, os Bengals ainda eram um time jovem, com menos de dez anos de existência. Não assombra – da mesma maneira que ocorreu com os Texans em 2002 – que sua linha ofensiva estava dentre as piores da NFL no período.

Pensando nisso, Walsh, enquanto técnico assistente, pensou em desenvolver um sistema ofensivo que escondesse a falta de capacidade de sua linha para segurar bloqueios longos – ao mesmo tempo em que pudesse passar a bola com consistência. Pegando emprestado alguns conceitos de Sid Gillman – que anos antes havia revolucionado o jogo aéreo ao espalhar mais recebedores no campo – e de Al Davis – ao utilizar um playcalling mais imprevisível e que explorasse as deficiências do oponente em momentos críticos, Bill Walsh desenvolveu um sistema em Cincinnati que explorasse passes curtos e, por consequência, dropbacks mais curtos por parte do quarterback. Isto, por consequência, faria com que aquele ficasse menos tempo com a bola e por óbvio, sofresse menos sacks.

O problema é que Walsh foi renegado. Quando da aposentadoria de Paul Brown como treinador, por algum motivo obscuro, Brown não lhe passou o trono. Walsh não teve outra escolha senão sair do time em 1975. Seria uma decisão que assombraria a franquia, dado que o renegado técnico venceria o Super Bowl em cima de Brown e seus Bengals em duas ocasiões, 1981 e 1988. Depois de breve passagem pelos Chargers em 1976 e aperfeiçoamento de suas técnicas enquanto treinador de Stanford no biênio 77-78, Walsh finalmente teve sua chance como técnico principal na NFL. Demorou. Ele já tinha 48 anos.

O San Francisco 49ers estava um caos completo: havia demitido seu terceiro técnico em quatro anos e recém havia sido comprado por Ed DeBartolo Jr. A terra arrasada, em conjunto com o espírito liberal da Califórnia – mais a vivência progressista no campus de Stanford – fez com que ali fosse o cenário ideal para o aperfeiçoamento da filosofia ofensiva que determinadamente mudaria o contexto da NFL e de seu estilo de jogo.

Após a primeira temporada, em 1979, os 49ers continuavam em desgraça mesmo assim. O que ninguém sabia é que já naquele ano a sorte da franquia para os próximos dez anos – e quatro títulos do Super Bowl, decisivamente marcando o clube como Time dos Anos 80 – estaria traçada. Na terceira rodada os Cowboys, todos pensavam, pensariam em ir atrás de algum quarterback. O crepúsculo da era Roger Staubach se avizinhava e nem todos estavam certos acerca do talento de Danny White, recém-advindo da fracassada WFL. No board, o melhor jogador disponível era um quarterback magro de Notre Dame. Tom Landry não o escolheu. Preferiu ir com um defensive end, justificando depois que “os Cowboys não precisavam de um quarterback”. Dois anos depois, a decisão lhes assombraria na final da Conferência Nacional.

Na escolha seguinte, os 49ers não tiveram dúvida. Após o ano fraco de Steve DeBerg, Walsh jogou os dados na mesa. Por menos massa muscular que o tal de Joe Montana tivesse na época, ele compensaria com coração – vide a virada no Cotton Bowl daquele ano, no qual jogara gripado – e massa encefálica. Mesmo tendo pernas finas – apelidadas de “birdlegs” (pernas de pássaro) por seus colegas de time anos depois – Montana tinha uma capacidade única de sair do pocket e passar em movimento. Ou então de correr quando necessário – e apenas quando necessário.

Isso, mais a perícia de Montana em passes curtos, possibilitaram que Bill Walsh pudesse capitalizar mais do que nunca em cima das novas regras contra a defesa agressiva. Para poder marcar melhor, muitos times começaram a colocar os cornerbacks a sete jardas da linha de scrimmage. Walsh contra-atacou com passes curtos – rotas slant, drag e outras que priorizavam as jardas após a recepção. Este conceito, aliás, é o decisivo da filosofia West Coast: um passe de 20 jardas é mais difícil de ser completo se a bola estiver essas 20 jardas no ar – mas é mais fácil de ser gerado se o quarterback achar um espaço, numa antecipação, e o recebedor percorrer a maioria das jardas pelo chão com sua habilidade. Subitamente, as defesas pesadas da NFL na virada da década de 1970 para 1980, estavam “vendidas”, de mãos atadas.

Na maturidade precoce de Joe Montana como jogador profissional, Walsh foi capaz de desenvolver um dos mais complexos sistemas de plano de jogo aéreo até então vistos. Dropbacks rápidos, leituras rápidas e rotas curtas fizeram com que a defesa fosse vencida e frustrada em avanços curtos que não eram mais terrestres, mas aéreos com jardas após a recepção. Múltiplos passes para running backs foram introduzidos na época também – o screen, por exemplo, ali começa a ser utilizado.

Para que não houvesse confusão e para que o time ganhasse confiança já no início do jogo, a primeira campanha teria todas suas jogadas arquitetadas com dias de antecedência; a complexidade das rotas e das jogadas ofensivas nas primeiras campanhas eram anuladas pela preparação de dias, algo que Walsh introduziu e que todas as franquias da NFL fazem hoje. “Ajuda nossos jogadores a dormirem bem antes dos jogos, nós vamos ao campo sem borboletas no estômago e sem estarmos tensos, porque nós tínhamos sempre um plano”.

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