Titans “de volta para o futuro” com foco no jogo terrestre: vai dar certo?

Nos últimos anos, o foco dos sistemas ofensivos predominantes na NFL tem sido o jogo aéreo. Mais do que isso, os sistemas baseados na chamada spread offense (em que os recebedores se “espalham” pela largura do campo) têm saído do futebol universitário para ocupar cada vez mais seu lugar entre os profissionais. Apesar disso, o novo técnico do Tennessee Titans, Mike Mularkey, tem dado declarações sugerindo que busca basear o ataque de sua equipe em 2016 no jogo terrestre, mais especificamente no jogo corrido de força (power running). Hoje, aqui no Pro Football, analisaremos de que maneira os Titans poderiam instalar este sistema de jogo, além de motivos pelos quais essa escolha até certo ponto inusitada poderia dar certo ou errado. Finalmente, pra não ficar em cima do muro, daremos nosso palpite sobre qual será o resultado da estratégia adotada pela equipe.

Power Running

O Power Running (jogo corrido de força) se caracteriza por corridas direcionadas para a frente, com bloqueios baseados na abertura de espaços no meio da linha defensiva do adversário – ou, sob o ponto de vista do ataque, entre os offensive tackles. Esses buracos são abertos, como o nome sugere, na base da força, com o deslocamento direto do defensor pelo jogador da linha ofensiva, ou através de bloqueios duplos, nos quais dois bloqueadores se juntam sobre um defensor, o que determina qual será o espaço aberto para o running back. O esquema se diferencia dos bloqueios por zona, em que a linha ofensiva se move em conjunto para um dos lados do campo, cabendo ao running back que corre em paralelo à linha encontrar o melhor caminho para seguir, fazendo então seu corte (cutback).

Ainda que a maior parte das equipes da NFL hoje em dia utilizem os dois estilos de jogo terrestre, é possível perceber que cada uma dessas estratégias funciona melhor com um tipo específico de corredor e, principalmente, de jogadores de linha ofensiva. Os bloqueios por zona favorecem a utilização de jogadores de linha ofensiva mais leves e ágeis, capazes de se mover lateralmente de forma veloz e fluida. Os running backs, por sua vez, devem ter velocidade no “corte” (mudança abrupta de direção) para a frente e boa visualização do espaço à frente, para escolher a direção correta do corte. Um bom exemplo desse “tipo” de corredor é o do novo running back dos Dolphins, Arian Foster – o qual teve mais sucesso com um técnico que preferia o bloqueio em zona, Gary Kubiak.

Já no power running, os jogadores de linha devem ser grandes e fortes, sendo a firmeza para sustentar bloqueios com o corpo mais importante que a velocidade da movimentação. Da mesma forma, os running backs devem ser capazes de seguir abrindo buracos e quebrando tackles no meio da defesa, sendo frequentemente jogadores muito fortes, ainda que não possuam uma velocidade tão alta. Jonathan Stewart, do Carolina Panthers, preenche os critérios de um power running back.

O Plano dos Titans

Logo após as mudanças na direção do Tennessee Titans, com a contratação do General Manager Joe Robinson e do técnico Mike Mularkey, o novo plano de montagem do time começou a ser realizado. Para instalar o sistema de jogo corrido de força, o draft dos Titans se concentrou em jogadores de ataque capazes de atuar neste esquema. A equipe detinha a primeira escolha geral, que foi trocada com o Los Angeles Rams (que por sua vez selecionou o quarterback Jared Goff). No dia do draft, Tennessee voltou a subir na primeira rodada às custas de trocas, para selecionar o tackle Jack Conklin. Conklin é considerado um ótimo bloqueador de corridas, tendo deficiências na proteção do passe. A mentalidade agressiva do jogador certamente também contribuiu para a escolha dos Titans. É provável que Conklin inicie a temporada como right tackle, enquanto Taylor Lewan (escolha de primeira rodada no draft de 2014) fica com o lado esquerdo da linha. As posições internas da linha também devem ser ocupadas por jogadores adequados ao jogo corrido de força, como os guards Chance Warmack e Jeremiah Poutasi.

Ainda no draft, na segunda rodada, os Titans selecionaram o running back Derrick Henry, que com 1,91m de altura e 108Kg de peso, pode ser o aríete do ataque da equipe, abrindo caminho pelo meio da defesa. Além disso, a equipe trouxe o ex-running back dos Eagles e Cowboys DeMarco Murray. Murray teve muito destaque em Dallas, sendo o melhor corredor da liga em 2014, em um sistema que o permitia correr verticalmente. Já em Philadelphia, no ano passado, jogando em um esquema de corridas por zona a partir da formação shotgun, Murray teve uma péssima temporada. Os Titans esperam que o running back possa, atuando em um esquema mais adequado às suas características, retornar ao auge.

Apesar de todo o foco no estabelecimento do jogo corrido de força, Mike Mularkey sabe que não adianta apenas correr pelo meio em todas as jogadas. As defesas podem facilmente se adaptar, atuando com jogadores maiores na linha defensiva, minimizando os ganhos com o jogo terrestre. Por isso o treinador define seu esquema como “exotic smashmouth” (algo como “rolo compressor exótico”, em tradução livre). Mularkey, quando coordenador ofensivo do Pittsburgh Steelers, no início dos anos 2000, utilizou este sistema, em que o jogo corrido liderado pelo running back Jerome Bettis (“The Bus!”) era a base. O componente “exótico” vinha dos passes longos e das corridas do quarterback Kordell Stewart. Stewart era um jogador atlético, muito veloz e forte fisicamente, ainda que apresentasse limitações importantes na precisão nos passes.

Agora, em Tennessee, Mularkey busca utilizar os atributos do quarterback Marcus Mariota como o componente complementar do ataque da equipe. Mariota foi muito bem em sua primeira temporada na NFL, demonstrando um futuro promissor na liga. A equipe técnica certamente contará com o desenvolvimento do quarterback para trazer a variedade que o esquema precisa para ser bem-sucedido. Mariota é um jogador muito inteligente, capaz de leituras rápidas e eficientes, além de saber correr bem com a bola. É provável que os Titans busquem o sucesso no jogo aéreo através do play action, lançando mão também do zone read, para aproveitar a capacidade de Mariota de ser mais um corredor na equipe.

Certamente uma das ideias de Mike Mularkey é reproduzir o sucesso do ataque do Carolina Panthers nesta última temporada. Nos Panthers, o jogo corrido era liderado por Jonathan Stewart e pelo quarterback Cam Newton, que alternava suas corridas com passes longos. Uma outra possível semelhança entre os dois ataques é o fato de que os dois têm no tight end seus principais recebedores. Tennessee conta com Delanie Walker, jogador extremamente subestimado, para exercer a função de válvula de escape, que nos Panthers está a cargo de Greg Olsen. Mas é claro que, como veremos mais à frente, não é simples chegar a essa proficiência ofensiva.

Até agora, nos concentramos principalmente no que seria o ataque dos Titans de acordo com o plano da equipe técnica. Mas, como sabemos muito bem, nem sempre os planos dão certo. A seguir, falaremos dos possíveis problemas na implantação do sistema ofensivo.

Possíveis Problemas

Dentro de uma liga que cada vez mais se direciona para o jogo aéreo, inclusive com alterações nas regras e nas ênfases aos árbitros que facilitam a vida dos quarterbacks, é possível obter sucesso focando seu ataque no jogo corrido?

É e não é. Um jogo corrido eficiente, capaz de conquistar jardas de maneira regular, pode ser a ferramenta principal de um sistema ofensivo. Mas nunca sem um quarterback capaz de criar espaços e ganhos de jardas mais explosivos. E quando, como no caso dos Titans, o elenco ofensivo é montado com o olhar do jogo terrestre, a pressão sobre o quarterback torna-se ainda maior.

Marcus Mariota, em seu segundo ano na liga, terá que jogar atrás de uma linha montada para abrir espaços, mas fraca no quesito de proteção ao quarterback. Além disso, apesar do bom tight end, o corpo de recebedores dos Titans é limitado. Não há dúvida quanto ao talento de Mariota, mas talvez o foco de sua equipe no jogo corrido acabe prejudicando seu desenvolvimento como quarterback.

Outro aspecto que envolve Marcus Mariota e que pode trazer dificuldades para o ataque do Tennessee Titans é a busca pela semelhança com o ataque no Carolina Panthers. Além de ter uma linha ofensiva e corredores eficientes, os Panthers contam com um running back coringa a cada jogada – mas, que frise-se, passa bem mais do que corre. Esse é um dos impactos de Cam Newton em seu ataque. Sua capacidade de ser um corredor de força, que abre caminhos na defesa, é uma grande trunfo do ataque de Carolina. Ainda que Marcus Mariota tenha muitas chances de se desenvolver em um grande quarterback na NFL, ele nunca será um corredor como Newton, capaz se ser parte integral do power running. É fundamental que a comissão técnica dos Titans permita o crescimento de Mariota dentro de suas características, como passador com bom ritmo e capacidade para corridas pelas laterais, principalmente em scrambles.

Finalmente, chegamos às possíveis limitações dos próprios running backs. Sabe-se que corredores mais velhos em geral têm dificuldades em manter boas performances. Quando é um running back que vem de uma temporada muito ruim, é ainda mais fácil desconfiar. DeMarco Murray foi muito mal em Philadelphia. Ainda que muitos possam afirmar que o sistema de bloqueios por zona era ruim para ele, não há garantias de que o corredor voltará a apresentar o desempenho de 2014 em Dallas, quando foi o principal running back da liga. Vale lembrar que Dallas tinha (e ainda tem) aquela que é considerada a melhor linha ofensiva da NFL.

Já Derrick Henry não tem o fator idade para atrapalhá-lo. Mas sua pouca flexibilidade pode vir a ser um problema. Apesar de sua força, nenhum running back na NFL consegue sucesso só quebrando tackles. O tamanho e a força dos defensores faz com que isso seja impossível. É necessário que o corredor tenha agilidade para desviar dos defensores e manter a progressão para a frente. Isso, somado ao número elevado de corridas de Henry durante sua carreira universitária, traz dúvidas quanto à sua eficácia e durabilidade na NFL.

Vai dar certo?

Considerando o aparente compromisso do Tennessee Titans com a consolidação do seu jogo corrido de força como a principal ferramenta de ataque, podemos traçar algumas projeções. Os Titans montaram uma linha ofensiva muito forte, porém pouco versátil, que pode colocar o quarterback Marcus Mariota em dificuldade. Mariota, justamente, que será o principal responsável por um eventual sucesso da abordagem ofensiva da equipe. Se ele for bem-sucedido como catalisador das jogadas de passe que podem desviar a atenção da defesa contra o jogo corrido, a equipe terá grande chance de obter bons resultados.

Por outro lado, se a comissão técnica não facilitar o trabalho do quarterback, concentrando-se exclusivamente no jogo corrido, esperando que Mariota seja Cam Newton, há poucas chances de dar certo. Logo as defesas vão se adaptar, bloqueando os running backs. Mariota não será capaz de correr entre os tackles como Newton, desta forma aumentando ainda mais a pressão sobre o jogo de passes. Mesmo considerando o tremendo potencial de Mariota, é muito pra se pedir de um quarterback inexperiente. Ainda mais com recebedores medianos.

Assim, é difícil acreditar em um sucesso imediato do ataque dos Titans, ainda que o futuro pareça promissor com Marcus Mariota. Resta saber se Mike Mularkey e seu “exotic smashmouth” estarão lá quando esse futuro chegar.

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