Gigante Bowl – estivemos lá e te contamos como o sonho se tornou realidade

Ontem foi um dia muito especial para o futebol americano jogado no Rio Grande do Sul. O Gigante Bowl marcou a estreia de megaeventos do futebol americano em solo gaúcho. E para uma data tão distinta, eu tinha a obrigação de chegar cedo ao estádio Beira-Rio – casa do Sport Club Internacional.

Chguei por volta das 14h30, ainda restavam uma hora e mais para abrir os portões. O estádio está praticamente vazio. Somente as equipes de reportagem e seguranças estão lá dentro. Alguns poucos ambulantes com camisetas de franquias da NFL – de origem duvidosa – estão ao redor do Gigantinho – o ginásio do Complexo Beira-Rio. Do lado de dentro, os pintores reforçam as hashmarks e números do gridiron. Os goal posts foram instalados na sexta. Esta é a primeira vez que o colorado utiliza o gramado para outro esporte.

Com um cronograma rígido, o Inter abriu os portões às 16h. O clube tratou de seguir a risca as apresentações para entreter o público logo no começo, o relógio bateu 16h30 e o DJ Fina iniciou os trabalhos com os hits musicais do momento. Na sequência, a banda Tchê Barbaridade deu o tom gauchesco, junto com um grupo devidamente trajado com roupas típicas gaúchas para dançar, aos fãs que lotavam o anel inferior da casa colorada.

Falando em público, o recorde gaúcho foi quebrado em questão de minutos. A liderança pertencia ao Estádio da Montanha, em Bento Gonçalves, onde cerca de 2100 pessoas assistiram a vitória magra de 2 a 0, do Santa Cruz Chacais contra o Bento Gonçalves Snakes, na temporada regular de 2016. A final deste ano precisou de apenas 10 minutos para ser vencida. A expectativa era superar a liderança da Arena Pantanal, no jogo entre Cuiabá Arsenal e Coritiba Crocodiles, de 15.197 pessoas. A noite de ontem não superou o público do Mato Grosso, mas com certeza ficará no Top 3 brasileiro.

Ainda resta uma hora para iniciar a partida, e como é legal ver o Beira-Rio se adaptar bem rápido para a prática do futebol americano. Isso sem contar a infraestrutura “padrão Fifa” com show de luzes, o que me faz sonhar ainda com uma partida da National Football League no Brasil.

As cabines de imprensa ficam do lado oposto onde ficou concentrada a audiência, mas daqui pude reconhecer diversas jerseys de equipes do resto do Estado, camisetas de times de Santa Catarina, além das tradicionais franquias americanas.

O show do Tchê terminou às 17h10. Para não perder o entretenimento, Fina seguiu com o ritmo eletrônico. O Inter quis dar um tom mais próximo dos eventos realizados nos Estados Unidos, os fãs puderam se apreciar nos dois telões.

Se o Super Bowl 50 contou com a atração internacional do Coldplay, o Inter fez questão de ter a sua versão pocket: a portuguesa Katia Aveiro – também conhecida por ser irmã do jogador Cristiano Ronaldo – animou um pouco a torcida. A irmã do jogador do Real Madrid e seleção portuguesa entrou com roupas bem curtas e ousadas, mais um tecido branco que cobria partes de suas pernas. Mesmo que Porto Alegre e Lisboa tenham o clima parecido, a gélida capital gaúcha não pedia pouca roupa. Coragem da europeia.

Um detalhe interessante de Katia: ela não é tão conhecida em Portugal, mas sim no vizinho ibérico, a Espanha. Não a toa que a cantora portuguesa tem muitas canções em espanhol, e chegou a participar de um reality show no estilo Survivor na terra da paella.

Um pedido de casamento fora do script

A poucos minutos do kickoff, o Beira-Rio ficou completamente escuro. Um show de luzes misturadas pelos holofotes e celulares foi uma atração à parte no Gigante Bowl. Mas um dos holofotes estava apontando para o meio da torcida. Parecia um erro do show. Isso não estava no cronograma enviado à imprensa. Entretanto, o telão mostra o rosto de um torcedor com a camiseta do Restinga Redskulls. Um microfone se aproxima e ele surpreende sua companheira com um pedido de casamento. Cartazes foram levantados com a palavra “sim”. A futura noiva cedeu e aceitou o pedido. Isso tá virando moda no Brasil: pedidos de casamento no futebol americano.

Na sequência, o locutor do estádio anunciou a entrada de Santa Maria Soldiers. Os soldados entraram ao som de Thunderstruck, do AC/DC. Os jogadores passaram por totens que disparavam labaredas que davam acesso ao gramado. Depois foi a vez do Juventude, do lado oposto, e ao som de Remember the name, do Fort Minor.

Com os jogadores perfilados, a banda marcial da Escola Estadual Julio de Castilhos – umas mais tradicionais escolas de Porto Alegre – adentrou no gramado para tocar o hino nacional brasileiro. Se Lady Gaga lembrou Whitney Houston ao cantar bem o hino americano, Christina Sorrentino não ficou para trás desta dupla ao entoar o hino rio-grandense com maestria e beleza, para arrepio dos presentes. A soprano contou com a participação do músico Renato Borghetti, conhecido aqui nos pampas pela música tradicionalista.

O jogo

São 18h24, a temperatura caiu para os 10ºC, quando o kicker do Juventude, Matheus Ely, manda a bola pelos ares. A torcida grita para deixar o Beira-Rio ensurdecido. O sonho se tornou realidade.

No terceiro drive da partida, o elenco de Santa Maria entra na redzone adversária. O jogo simples de corrida em I-formation é facilmente parada pela defesa de Caxias do Sul. O special team liderado pelo kicker Maurício Faé tem a chance de abrir o placar em um field goal de 25 jardas. O chutador que teve um aproveitamento de 75% de acerto ao longo do campeonato desperdiçou a oportunidade.

Com os times nervosos em campo – e em minha opinião: isso é obvio, não é todo o dia que se joga num estádio como estes; já fui jogador e tenho ideia de como é atuar para um grande público – os panos amarelos apareceram muitas vezes no primeiro quarto e o jogo seguiu no 0 a 0.

Com a entrada do segundo quarto, o QB dos Soldiers, Wagner Freitas, saiu da I-formation para uma shotgun recheada de tight ends, tudo indicava que seria uma corrida pelo meio. Freitas em handoff entrega a bola para o running back Guilherme Busanello, que encontra um gap D vazio de marcação, o jogador percorreu 11 jardas para ultrapassar a goal line pela primeira vez. Desta vez, Faé acertou o pé para converter o extra point.

O atual campeão gaúcho buscou responder de forma imediata. O running back Bruno Bortoluzzi carregou o piano em duas big plays. Numa delas, uma corrida de 38yd para touchdown, porém um holding do ataque anulou todo o esforço do RB. Antes do término do primeiro tempo, Ely descontou para o Juventude em um field goal de 33 jardas. 3-7.

O segundo tempo

Após a parada do intervalo, o segundo tempo iniciou às 20h16 e a temperatura caiu mais um grau Celsius. Com o clima gelado e propício para futebol americano, o jovem quarterback Eduardo Cauzzi foi interceptado pelo safety Fabricio Ziegler na primeira campanha do Ju. O defensive back retornou umas 30 jardas, para posicionar os Soldiers na redzone mais uma vez. Em uma chamada ousada do treinador Gustavo Petter, o QB Freitas deixou na altura da barriga do wide receiver Douglas Elesbão numa end around de 9 jardas para touchdown. O backup kicker Fabricio da Silva acertou o chute de bonificação.

Com problemas no ataque, o jovem treinador do Juventude, Wesley Mota, ficou perplexo com um erro bizarro dos seus especialistas no drive seguinte. Numa tentativa de FG de 50 jardas, o holder resolveu olhar a sua sideline, o long snapper executou o hike, a bola quicou a um passo de Ely, que teve de se desdobrar para não perder mais jardas no esquisito fumble. Um turnover on downs que mostrou a falta de comunicação do holder com a linha de ataque.

O último quarto chegou rápido. Com o time de Caxias precisando pontuar logo, o ataque improvisa uma trick play. Cauzzi faz um shovel pass para o wide receiver Vagner Pacheco e dispara numa rota fly. O recebedor sob pressão tenta o lançamento para o QB. Ligado na jogada, Ziegler aparece pela segunda vez para interceptar o passe, para desespero da torcida organizada do Juventude, os Barbas Verdes. Apesar da interceptação, a campanha dos Soldiers termina sem sucesso.

Com pouco mais de 2 minutos para jogar e duas posses de bola atrás do placar, Cauzzi sofreu três sacks consecutivos. Em outro turnover on downs e dentro das linhas inimigas, Freitas manteve a simplicidade da I-formation. Em uma corrida curta de Busanello, o running back entrou na endzone para decretar a conquista do tricampeonato estadual do time do centro do Estado. Da Silva encerrou com o acerto do point after touchdown. Neste momento, alguns loucos sem camisetas da torcida de Santa Maria começaram a gritar “é campeão”. O atual vencedor perdia a invencibilidade de oito partidas em competições estaduais. O exército santa-mariense sentiu o gosto da conquista mais uma vez. Fim de papo no bowl mais frio da história do Brasil e 21 a 3 para os Soldiers – poderia até brincar e chamá-lo de Ice Bowl. O meu sonho e de mais 12.066 fãs estava realizado.

OBS: Foto: Divulgação do pessoal do Touchdown Gaucha no Twitter.

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