O que são os training camps da NFL e qual sua evolução histórica?

Traçar um ponto de partida para a “criação” dos training camps é um tanto quanto difícil. Você pode revirar a internet e dificilmente irá encontrar alguma coisa objetiva sobre como os camps surgiram. Tivemos que revirar a biblioteca para atender a essa sugestão de pauta de nossos sócios aqui do site. Antes de mais nada, para traçar o histórico dos camps, é importante contextualizar e dizer o que é esse tal de training camp que começa em julho e que ocorre em paralelo com a pré-temporada da NFL.


Traduzindo ao pé da letra, seria algo como “acampamento de treinos”. Não igual àqueles que você vai no verão quando criança e há gincanas, mas um lugar afastado de eventuais distrações para que os jogadores estejam focados. Como tantas invenções, a noção de camp vem primeiramente da necessidade. E como muitas das estruturas no futebol americano profissional, a inspiração vem do beisebol.

Caso você tenha cabulado muitas aulas de geografia, o eixo de inclinação da Terra é… Bem, é inclinado. O hemisfério que está no verão recebe uma maior incidência solar por área, já que os raios que incidem lá estão mais perpendiculares à superfície terrestre. Como um mesmo “raio solar” aquece mais área em um hemisfério que no outro, o primeiro fica mais quente e passa pelo verão.

É por isso que no início de cada ano é inverno no hemisfério norte: justamente quando a temporada do beisebol começa.

Como não dá para jogar beisebol na neve, as equipes da Major League Baseball desde o final do século XIX viajam para o sul dos Estados Unidos – onde raramente neva – para poder treinar e aperfeiçoar as habilidades de seus jogadores sem a intervenção negativa do clima em seu plantel. Essa é a principal inspiração do training camp da NFL, os spring trainings do beisebol. De modo adicional, tal qual – também – outras estruturas da liga profissional, a inspiração de dormir onde se treina vem do fato do futebol americano profissional ter seu berço no futebol americano universitário – no qual os “estudantes-atletas” dormem no campus (na maior parte dos casos).

Seja Training Camp, então, uma estrutura de treinamentos – ao menos dois por dia – palestras, com os jogadores assistindo a vídeos dos treinos e todo o mais. Esses treinamentos ocorrem longe de onde as equipes normalmente estão localizadas – novamente, na maior parte dos casos, os Patriots por exemplo têm seus camps ao lado de seu estádio. É questão de costume. Quando da instituição de camps na maior parte dos times da liga, boa parte destes dividiam seus estádios com times da Major League Baseball – então unia-se a necessidade à invenção, novamente. Os Rams, que desde 2016 voltaram a jogar no Los Angeles Memorial Coliseum, treinam no campus da Universidade de Califórnia em Irvine. Os Bears treinam em Bourbonnais, Illinois, não em Chicago. Geralmente as instalações de uma universidade são utilizadas nesse período.


Feita a definição, vamos para a evolução histórica. Como, de fato, começaram os camps como temos hoje? Na prática – por conta da inspiração do beisebol – ele existe desde a fundação da NFL em 1920. Mas e como ocorre hoje? Tal qual outras inovações que injetaram profissionalismo e seriedade no jogo, Paul Brown pode ser reputado como o pai do training camp moderno. Nos anos 1940, os camps eram bagunçados e os treinamentos em pouco eram diferentes daqueles que aconteciam durante a temporada regular. Quem começou a tomá-los como instrumento de preparação de elenco foi Brown com o Cleveland Browns.

Enquanto os outros técnicos ainda estavam pensando em termos do que ocorre apenas dentro do campo, Brown viu uma oportunidade na liberação do passe para frente lançado de qualquer lugar antes da linha de scrimmage – coisa que ocorreu em 1933 mas que não gerou um efeito tão imediato na revolução do passe. Até então, o jogador deveria estar 5 jardas antes da linha para poder passar a bola para frente. George Halas, em Chicago, preferia focar em jogo terrestre e bloqueios durante os camps. Brown, em Cleveland, optou por focar na organização e em ensinar seus jogadores.

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O regime de Brown era espartano. Às 7 da manhã um alarme de incêndio tocaria para acordar os jogadores, sediados no campus de Bowling Green. O café da manhã seria servido meia hora depois e o treino começaria 9:30. Almoço meio dia em ponto, mais treino às três da tarde, jantar às 18:15, reuniões depois e os jogadores na cama até 10 da noite. De uma forma ou de outra, mais de 70 anos depois, o regime dos camps segue mais ou menos essa estrutura – tal qual podemos ver em Hard Knocks, o reality show da HBO que acompanha um time todo ano durante julho e agosto.

Depois de Brown na década de 40 – com seus múltiplos títulos – essa estrutura se espalhou pela liga como pólvora queimando. E foi aperfeiçoada de modo que os camps, na década de 1960 e 1970, tinham praticamente uma estrutura militar. “John Madden fazia a gente trabalhar até não poder mais nos training camps“, disse Pete Banaszak ao Deadspin. Hoje aposentado e conhecido pelos mais jovens por conta do jogo de video-game homônimo, Madden era um dos treinadores mais exigentes durante a pré-temporada. Seus treinamentos diários (ou melhor, os dois, chamados two-a-days) eram conduzidos sob o sol do meio dia da Califórnia. Praticamente no mesmo período, quando Don Shula ainda estava com os Colts, era frequente o ato de desidratar os jogadores de maneira proposital.

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Esse regime espartano mudou em 2001, com a morte de Korey Stinger – o jogador, do Minnesota Vikings, teve um ataque cardíaco durante os camps. Desde então o nível de exigência praticamente militar diminuiu. Há regras, desde o último acordo coletivo-trabalhista entre o Sindicato de Jogadores e a liga, para evitar desastres como esse. Os três primeiros dias de camp não têm contato físico. Os técnicos por vezes checam a cor da urina dos jogadores para ver quão desidratados eles estão nos treinos, que ocorrem durante o verão americano. Treinos com pads não podem durar mais de três horas – e não pode haver dois deles por dia, um será sem. Jogadores têm de tirar folga pelo menos um dia por semana.

Enfim, as coisas mudaram e não são como na época de Brown, com alarme de incêndio e jogadores sendo exigidos como se estivessem no exército. Tampouco como na época de Shula e Madden. De toda sorte, o training camp é a época na qual os jogadores são mais exigidos, tanto mentalmente quanto fisicamente. Depois deles, uma guerra de quatro meses começa. Não é a toa que antigamente a preparação era praticamente igual a de soldados.

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