Jogando em casa numa partida que muito provavelmente acontecerá de novo em janeiro e contra um time cuja defesa tem como maior deficiência o jogo terrestre: tudo parecia encaminhado para que houvesse finalmente uma melhora na unidade ofensiva do New England Patriots. A defesa do Kansas City Chiefs entrou a partida de domingo como a terceira pior em jardas terrestres cedidas/jogo (141.3) e também a terceira pior em jardas terrestres/corrida (5.11). Conseguiram limitar Sony Michel a cinco carregadas, oito jardas terrestres e tão somente isso.
Esse é apenas um dos problemas crônicos do ataque patriota. Nem quando a defesa adversária é “o que o médico receitou” as coisas estão dando certo. Os números assustam bastante e não é de hoje que falamos isso. Os Patriots são 25º em jardas por jogada, 17º em terceiras descidas, 27º em aproveitamento na red zone e nas últimas cinco semanas, 26º em pontos por jogo. A situação tem certa urgência porque já demos tempo demais para a Magia Belichischika ser empregada e a casa ser arrumada.
A princípio, era apenas um jogo em semana curta com tempo ruim (Thursday Night Football contra o New York Giants). Depois, tínhamos que esperar Isaiah Wynn voltar para reforçar a linha ofensiva. Ainda, era preciso dar tempo para química com Mohamed Sanu e N’Keal Harry – wide receivers que não terminaram a temporada com o time. Tudo isso já aconteceu e New England segue patinando. Chegou a hora de aceitar: o ataque patriota está na “metade de baixo” da NFL nesta temporada.
Ainda há solução?
Não. Tudo o que podíamos esperar já aconteceu e ainda não houve melhora. Esperar por mais coisas seria passar pano. Nem mesmo o argumento intangível de “vamos esperar chegar dezembro porque aí o Opala 1977 pega no tranco” aconteceu. Os Patriots começaram dezembro com duas derrotas seguidas pela primeira vez desde 1992, ano no qual terminaram com campanha de 2-14 e antes de haver Robert Kraft, Bill Belichick ou qualquer peça fundamental da atual equipe.
Ainda há um pingo de esperança por parte do torcedor: Tom Brady se expor mais ao contato durante a pós-temporada. É notório que Brady está se livrando da boal de qualquer forma quando a pressão chega. O aproveitamento de Brady sob pressão é o segundo pior da NFL nesta temporada – dois anos depois de ter sido o melhor. Apenas Josh Allen tem menor porcentagem de passes completos quando pressionado. Contra os Chiefs, Brady teve 4-14 nesses passes.
É esperado que quando a pós-temporada chegue e, com ela os jogos de eliminação única, Brady segure um pouco mais a bola e a isole menos ao menor sinal de pressão. Afinal, é na pós-temporada que se separam os homens dos meninos e já sabemos do caráter de Brady quanto a isso. Em resumo, no momento, ele está na linha tênue de “fazer o mínimo possível para ter a folga na primeira semana dos playoffs“. Isso, ao menos, tudo indica que conseguirá.
New England tem dois jogos contra adversários que estarão no Top 5 do Draft 2020: Cincinnati Bengals e Miami Dolphins. A única chance de apocalipse completo é em caso de derrota para o Buffalo Bills em casa mas sejamos francos: com Josh Allen de quarterback e com o jogo no Gillette Stadium, a chance disso acontecer é bem baixa.
Como chegamos a esse ponto?
O New England Patriots está enfrentando uma tempestade perfeita para debilitar um ataque que, no ano passado, embora não tenha sido vistoso havia sido eficiente. Foi o primeiro em jardas/tentativa no play action, por exemplo, numa NFL que foi tomada de assalto pelo Los Angeles Rams e pelo Kansas City Chiefs nesse tipo de jogada – e ambos eram muito mais falados nesse quesito do que New England.
O center David Andrews não jogou neste ano por estar com coágulo no pulmão. James Develin, fullback de extrema importância na temporada passada, também está machucado. Para completar o baque ao jogo terrestre, Rob Gronkowski aposentou. Eu sei que sua importância no jogo aéreo é o que ficou marcado na memória do torcedor, mas fato que ele era de suma importância no jogo terrestre – conforme ficou evidenciado na pós-temporada, em especial contra o Los Angeles Chargers e o Kansas City Chiefs. O declínio de produção terrestre sem essas três peças é notório. New England é o 29º da NFL em jardas por carregada, com 3.54.
De toda forma, Bill Belichick antecipou que essa possibilidade de caos poderia se concretizar. Pela primeira vez na Era Brady/Belichick, os Patriots draftaram um wide receiver na primeira rodada do Draft – Harry, neste ano. Ainda, no ano passado, pela primeira vez desde 2006 o time escolheu um running back na primeira rodada em Sony Michel. Peças eram necessárias para o ataque de New England porque poderia acontecer de “Tom Brady não transformar os quitandeiros de Boston em wide receivers de Pro Bowl”. Aos 42 anos e com erros de lançamentos, Brady está longe de ser capaz de potencializar uma unidade. Ele ainda tem os atributos mentais e o gene de decisão que é capaz de converter uma terceira descida longa numa final de Conferência. Contudo, o poder de melhorar os arredores de diluiu tal como acontecera com Peyton Manning em 2015.
Em 2015, Denver teve a melhor defesa da NFL e venceu o Super Bowl.
Considerando que o mesmo vale para a defesa dos Patriots neste ano, resta esperança em Foxboro – até porque o declínio de produção de Brady é menor do que aquele que vimos em Denver há quatro anos. pic.twitter.com/lm2FiHniZF
— Antony Curti (@CurtiAntony) December 10, 2019
Mas, como disse acima, o declínio é menor do que aquele que Peyton sofreu – e, em ambos os casos, a melhor defesa da NFL do outro lado da bola. É isso que sustenta as esperanças dos torcedores dos Patriots. Por outro lado, o ataque terrestre de Denver era bem melhor em 2015 – 4,18 jardas/carregada, 13º da liga. Então há argumentos para os dois lados. Aliás, esse é o grande ponto deste texto e de tudo isso: argumentos.
Não acabou a dinastia, mas as expectativas são menores
Em anos anteriores, seria mais fácil afirmar que o New England Patriots chegará e vencerá o Super Bowl. Em uma conversa de bar ou em um grupo de Whatsapp, essa afirmação teria bem menos resistência – por tudo o que era apresentado na temporada regular e pelo histórico da equipe em pós-temporada. Hoje, se você disser isso, vai ter uma chuva de argumentos em contrário. O time vai mal e há outros dois desafiantes fortes na “campeonato espanhol AFC” de outrora: Lamar Jackson e o Baltimore Ravens e Pat Mahomes e o Kansas City Chiefs.
Dito isso, New England pode chegar ao Super Bowl. Segundo a ESPN americana, o time tem 83% de chance de ter a folga na primeira rodada dos playoffs e, com isso, teria dois jogos para ir à Miami e ao Super Bowl LIV. É razoável e nenhum devaneio imaginar que o time vença essas duas partidas. Defesa e treinador para isso, tem. Ainda, Tom Brady vai se expor a mais pancadas. Esses são argumentos válidos. Dizer que vai acontecer pura e simplesmente porque “temos que respeitar porque já aconteceu antes”, a meu ver, não.
As expectativas, porém, são menores. Isso é cada vez mais claro. Dizer que a dinastia acabou é um absurdo, porque dinastia nenhuma acaba com folga na primeira rodada nos Playoffs. Mas é fato: não está divertido ver o New England Patriots jogar e o time, pela primeira vez em muito tempo, mostra-se frágil.







