Fora de Jogo: Vazio após a excelência

Mitchell Trubisky é, hoje, o provável titular do Pittsburgh Steelers, depois de quase duas décadas de excelência com Ben Roethlisberger

Como certamente não passou despercebido por você, caro leitor, Mitchell Trubisky se tornou um Pittsburgh Steeler. Afinal, nem todo mundo pode sair de uma era de Brett Favre para entrar numa de Aaron Rodgers. A segunda escolha geral de 2017 deixa a função de reserva de Josh Allen e se torna, até o momento, o favorito para ser o titular do hexacampeão do Super Bowl na próxima temporada.

Pelo caminho de Trubisky na NFL até 2022, é possível observar tensão e incerteza entre os fãs do time do oeste da Pensilvânia. Nos seus quatro anos de Chicago Bears, Trubisky mostrou dificuldades em leituras mais demoradas, notável imprecisão até com o pocket limpo, além da inabilidade geral em mover as correntes do ataque.

Preciso dizer, antes de mais nada, que o técnico Matt Nagy certamente teve um grande impacto no desenvolvimento do jogador. Vimos de perto como o ex-técnico não deu as melhores condições para que Justin Fields se tornasse o melhor que pode ser como calouro. Teimosia, sistemas amarrados que não consideravam os melhores atributos dos seus jogadores foram fatores fundamentais para a demissão de Nagy no final da temporada. Isso não isenta Trubisky, naturalmente. Entretanto, é importante termos uma visão holística do Chicago Bears dos últimos cinco anos.

Sendo assim, a chegada de Mitchell Trubisky ilustra um fenômeno interessante na NFL. Times, após anos, por vezes décadas de excelência precisam virar a página. O Pittsburgh Steelers teve Ben Roethlisberger desde 2004, venceu dois Super Bowls e, por mais que tenha sido melhor ou pior em certos momentos, sempre foi um dos favoritos na AFC. Agora, o vácuo na posição mais importante de qualquer esporte se escancara. É um choque de realidade para os torcedores e exige uma movimentação precisa do front office para encontrar um novo caminho, seja ele qual for.

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Mitchell Trubisky é um investimento de baixo risco, baixo custo e um teto, hoje, médio. É uma segunda chance como titular para um talento alçado às alturas durante o processo do Draft de 2017, por menor que tenha sido sua amostra nos tempos de North Carolina. O Pittsburgh Steelers mantém as costas quentes com fãs: caso Trubisky não tenha cacife para ser titular, o risco era baixo para um nome com alguns anos de NFL no currículo. Além disso, pode-se argumentar que ele não teve um ambiente diferente com espaço para ser titular depois dos atribulados anos em Chicago. Enquanto tentam a sorte com Trubisky, seria prudente buscar uma alternativa jovem, para herdar as rédeas do ataque caso o experimento seja catastrófico.

A situação em Pittsburgh não é tão distinta daquela do New Orleans Saints em 2021. Sem o lendário Drew Brees, o time colocou Jameis Winston como titular, após um ano como reserva da franquia. Com um claro vazio na posição de quarterback, o ex-técnico Sean Payton – como é estranho escrever isso – apostou no ex-Buccaneer com bons resultados. As características de Winston estavam presentes, como estiveram nos anos da Flórida, mas uma boa comissão técnica permitiu que as qualidades ficassem mais adiante que os defeitos. Foram cinco vitórias em sete oportunidades, antes de uma lesão que praticamente enterrou as pretensões da franquia na temporada.

Não foi exatamente um desabrochar de talento, mas o suficiente para criar um time competitivo. O melhor cenário para o Pittsburgh Steelers é manter o ambiente de disputa no topo da AFC North sob o comando de Trubisky. Isso é possível, claro, mas será um grande teste para Mike Tomline e sua comissão técnica. Desde que assumiu o cargo de treinador, Roethlisberger sempre foi uma certeza e sinal de estabilidade. Agora, deve lidar com o grande medo do torcedor após eras lendárias: a queda para a mediocridade. Podemos observar uma manifestação desse fenômeno com o Denver Broncos após a aposentadoria de John Elway. Por mais “adequado” que Brian Griese tenha sido para a franquia, o time só voltou a vencer uma partida de pós-temporada em 2005, com Jake Plummer, anos após a saída de Griese. De forma similar, após vencer o Super Bowl com Peyton Manning, o time do Colorado sofreu com Paxton Lynchs e Trevor Siemians da vida antes de encontrarem uma nova esperança com Russell Wilson.

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Claro que Trubisky pode deslanchar e se tornar um brilhante quarterback em 2022. No mundo de hoje, não seria uma das coisas mais esquisitas que poderiam acontecer. Entretanto, esse cenário é aquele do 1 em 1.000.000. É possível, embora não muito provável. O talento era esporádico, raro e afogado por erros. Não é nada contra o Trubisky; às vezes a “nota de corte” da NFL é alta demais.

Devemos sempre nos lembrar que a posição de quarterback é a mais escassa de todos os esportes. Não existem 32 de excelência no mundo. O Pittsburgh Steelers hoje é forçado a dançar uma valsa que não precisava desde 2004. A incerteza e instabilidade fazem parte da realidade do time da Pensilvânia pela primeira vez em muitos anos. Trubisky não é um tiro certeiro, como a troca de Russell Wilson entre Seahawks e Broncos. É mais uma das músicas na dança das cadeiras da NFL, que conta com um novo dançarino, vencedor de seis Super Bowls.

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