[dropcap size=big]N[/dropcap]o momento em que o mundo se prepara para assistir o Super Bowl do próximo domingo, muito da atenção é dispensada para os esquemas táticos utilizados tanto pelo Philadelphia Eagles quanto pelo New England Patriots.
Do lado dos Eagles, particularmente na pós-temporada, tem se falado muito sobre as run pass options (RPOs), jogadas em que a decisão de passar ou correr é tomada a partir do alinhamento da defesa.
Hoje, vamos analisar as origens e as características estratégicas das RPOs. Finalmente, é claro, vamos olhar para o uso desta arma pelos Eagles.
Bora lá então.
As origens
Em toda inovação estratégica ofensiva do futebol americano, o princípio é o mesmo. Busca-se estar um passo à frente da defesa, para quem sabe achar o ponto fraco da mesma. Assim, para contrabalançar unidades defensivas agressivas, utiliza-se mudanças de direção abruptas (misdirection) ou rotas com double moves. Se a defesa é forte no meio, contra o jogo corrido, abre-se a formação, espalhando os jogadores em toda largura do campo. E assim por diante.
Levando este princípio um pouco mais além, surge a ideia de que se possa decidir a jogada apenas após o posicionamento da defesa.
E os primórdios da jogada que, em pleno 2018, pode ajudar a decidir o Super Bowl, estão nos primeiros ataques baseados em option. Pois é. O triple option dos ataques a partir de formação wishbone, populares no futebol universitário nos anos 70 do século XX, está na base do que viriam a ser as RPOs. No option, o quarterback observa o posicionamento da defesa, “lendo” a movimentação de um dos defensores após o snap, optando então pelo handoff, por correr com a bola, ou ainda fazendo um pitch, pequeno lançamento lateral.
Claro que o option evoluiu, sendo lentamente incorporado às formações spread. Inclusive, possivelmente, o primeiro uso regular de algo se se assemelhe às RPOs atuais foi em Purdue, sob o comando do técnico Joe Tiller. Tiller, que empregava uma variação da spread offense, começou a utilizar jogadas em que seu quarterback na época (um tal de Drew Brees), baseado no posicionamento e na movimentação imediata da defesa após o snap, decidia entre fazer o handoff para o running back ou lançar um screen para um wide receiver. Depois disso, as RPOs se popularizaram em Auburn, sob o comando de Gus Malzahn.
Como sempre acontece, a NFL demora um pouco a “abraçar” as novidades que vêm do college. No entanto, a partir de 2013, mais ou menos, temos visto um crescimento exponencial do uso das RPOs entre os profissionais. Carolina Panthers, Cincinnati Bengals, Dallas Cowboys e Green Bay Packers estão entre as equipes que já utilizam a estratégia há algum tempo.
O auge das RPOs na NFL, no entanto, surge nos últimos 3 anos. Muito por conta de Andy Reid. O técnico do Kansas City Chiefs incorporou diversas variações da jogada em seu arsenal. Quando o então coordenador ofensivo dos Chiefs, Doug Pederson, foi contratado como técnico principal em Philadelphia, levou junto o conceito. Neste ano, as RPOs de Doug Pederson e Nick Foles ajudaram a levar os Eagles ao Super Bowl LII.
Princípios estratégicos das RPOs atuais
Atualmente, na liga, vemos algumas variantes específicas de run pass options. O tipo mais comumente empregado, muito usado pelo Green Bay Packers de Aaron Rodgers, por exemplo, é bem diferente das origens, ou seja, dos sistemas option. Nesta variação, o quarterback não espera o snap para “ler” a defesa. Já antes do início da jogada, muitas vezes com auxílio de alguma movimentação (como um receiver que troca de lado na formação), o quarterback identifica o grau de preparo da defesa em parar o jogo corrido. Se o caminho estiver fechado para o running back, o quarterback faz uma passe rápido para os recebedor. Se a defesa estiver “desviada” para a cobertura do passe, o quarterback faz o handoff.
Nesta jogada, a linha ofensiva bloqueia como faria em uma jogada terrestre, seja por zona ou usando bloqueios de força. É fundamental, então, que o quarterback se livre da bola rapidamente, para que não haja jogadores da linha ofensiva mais de uma jarda à frente da linha de scrimmage (o que seria falta – recebedor inelegível).
Outro tipo ainda utilizado (a meu ver, menos do que deveria) é o zone read “acoplado” a um rollout do quarterback. Neste subtipo específico, o quarterback faz a leitura após o snap de um dos jogadores da linha defensiva, tendo a opção de entregar a bola para o running back ou ficar com ela. A diferença para o zone read tradicional é que o quarterback faz um rollout, ou seja, sai do pocket lateralmente, tendo então a opção, a partir da leitura do jogador da secundária, de fazer uma lançamento intermediário ou longo (se o cornerback, por exemplo, vier atrás do quarterback) ou correr com a bola (caso o cornerback siga na cobertura do recebedor).
Seattle obteve muito sucesso com este tipo de jogadas, aparentemente ideal para um quarterback como Russell Wilson. Sinceramente não entendo muito bem o motivo da equipe não utilizar mais a RPO com rollout. Finalmente, chegamos à variante de RPO mais utilizada pelos Eagles, particularmente com Nick Foles no comando do ataque. Com Foles recebendo os snaps, Doug Pederson precisa manter o quarterback no pocket. Afinal, Foles não tem a mobilidade e a capacidade de improviso de Carson Wentz. Com a perda do quarterback titular para a contusão no joelho, Pederson ajustou suas RPOs, com grande sucesso nas duas partidas de playoffs vencidas pelos Eagles.
Aqui um dos exemplos da Run Pass Option que os Eagles fizeram à rodo na temporada. Como o nome diz, o quarterback escolhe passar ou entregar a bola para a corrida EM FUNÇÃO do que a defesa fizer de “pior” para defender pic.twitter.com/Gu3cum50we
— Antony Curti (@CurtiAntony) 3 de fevereiro de 2018
Como certamente veremos no jogo de domingo, as RPOs dos Eagles são baseadas, principalmente, em leituras após o snap. Mas não necessariamente de um jogador da linha defensiva, como no modelo clássico do zone read. Até porque, obviamente, Nick Foles não traz grande ameaça de correr com a bola (ao menos, não traz ameaça para o adversário…).
Assim, após o snap, enquanto se movimenta para fazer o handoff (e com a linha ofensiva bloqueando para a corrida), Foles lê um jogador do segundo nível da defesa (um linebacker ou safety, dependendo da jogada). Se este jogador se antecipa para defender a corrida, o quarterback “puxa” a bola de volta para si, fazendo o lançamento para o local que o defensor deixou vazio. Por outro lado, se o defensor se mantém na cobertura, o quarterback sabe que o box estará mais livre, mantendo o processo do handoff para o running back.
Gato e rato (e Belichick)
A RPO é a nova onda do imperador. Ou seja, é uma das ferramentas mais utilizadas atualmente para que os ataques estejam sempre um passo à frente da defesa. Toda a ideia do option é essa mesmo. Se a defesa vai pra um lado, o ataque se adapta no meio do caminho e vai pro outro.
Mas as defesas se adaptam. A West Coast Offense dominou a NFL nos anos 80 e 90… e foi eventualmente suprimida. O zone read teve um boom por volta de 2010… e cadê? Poderíamos descrever vários exemplos deste tipo. Possivelmente com as RPOs será assim também. O jogo de gato e rato de coordenadores ofensivos e defensivos está incrustado na história do futebol americano, em todos os seus níveis.
E quando um desses gatos (ou ratos, dependendo do ponto de vista) é um dos maiores técnicos e estrategistas defensivos da história do esporte? Claro que estamos falando de Bill Belichick. O técnico dos Patriots certamente passou as últimas duas semanas arquitetando um contraponto às RPOs dos Eagles.
Taí um aspecto legal de se ver no Super Bowl.
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