Quatro Descidas é a coluna semanal de Antony Curti sobre a NFL, publicada todas as segundas. São quatro assuntos de atualidades da liga. Para ler o índice completo da coluna, clique aqui.
1st and 10: Aaron Rodgers, MVP
Chegamos ao fim da temporada e acredito que já possamos determinar quem é o jogador mais valioso de 2020 – o MVP, cujo espaço amostral é apenas da temporada regular e, lembrando, playoffs não contam. Teremos os demais prêmios de temporada na semana posterior ao Pro Bowl (fictício e imaginário Pro Bowl nesta temporada) mas gostaria antes de falar sobre o prêmio mais importante para enquanto a pauta ainda está quente. 48 e 42. Você sabe o que esses números significam?
O Green Bay Packers teve 48 passes para touchdown com Aaron Rodgers. Ao mesmo tempo, foram 42 punts de J.K Scott. Na red zone, o ataque desenhado e chamado pelo head coach Matt LaFleur foi tão letal quanto possível: 80% das campanhas do time que chegaram até as 20 jardas finais do campo terminaram em touchdowns. Isso beira o absurdo. Para você ter ideia, o décimo colocado na estatística, o Arizona Cardinals, terminou com 65% – 15% a menos.
Rodgers descolou na briga pelo MVP nas semanas finais da temporada. Por mérito próprio também, mas é importante notar como o currículo dos outros jogadores acabou sendo menos laureado. Josh Allen disparou de volta ao topo, com nove passes para touchdown e apenas uma interceptação nos últimos três jogos – ao mesmo passo que comandou o Buffalo Bills ao segundo posto na Conferência Americana. Os jogos contra Kansas City, Tennessee e New York Jets no meio da temporada, porém, depõem contra Allen como MVP. Russell Wilson, eterno “MVP da primeira metade da temporada”, perdeu fôlego nos dois meses finais e pouca gente menciona o camisa três como MVP possível. Patrick Mahomes também perdeu fôlego e não jogou na Semana 17 – ao mesmo tempo que Aaron Rodgers estava voando. É verdade que Rodgers teve um jogo bem ruim contra Tampa Bay, mas foi um ponto completamente fora da curva, sendo o único jogo de Aaron com zero touchdowns e ao mesmo tempo com mais interceptações do que touchdowns. Mahomes teve uma sequência de um jogo ruim contra Miami – com três interceptações – e um jogo apagado para sair do palco da temporada regular contra Atlanta em casa.
Não entenda que este é um Congresso do ITA. É que números pesam bastante quando o assunto é o MVP. Rodgers foi o primeiro quarterback em vitórias na NFC e em porcentagem de passes completos (70,7%), touchdowns passados (48, quinta melhor marca da história) e menos interceptações (5). Foram quase 10 touchdowns para cada interceptação, uma razão fora de série e a sexta melhor da história da NFL. Se você não gosta de números ou de comparações com os demais passadores, vamos às narrativas.
Rodgers quebrou o recorde de touchdowns da história dos Packers (1919-2020) e liderou a liga na estatística aos 37 anos e no mesmo ano em que Green Bay draftou seu suposto sucessor, Jordan Love. Em 2005, quando foi draftado para suceder Brett Favre, este liderou a liga em interceptações. Green Bay sequer era favorito disparado nas bolsas de apostas para vencer a divisão – acabou perdendo apenas uma partida dentro da NFC North, a única na era Matt LaFleur-Aaron Rodgers. Em meio a tudo isso, sendo primeira campanha da Conferência e folgando na primeira rodada, é certo apontar que Aaron Rodgers é o jogador mais valioso da NFL. Entendo opiniões em contrário e as respeito – mas em se tratando da última temporada, é minha visão por tudo o que vimos acima: comparação, mérito próprio, números e narrativas.
2nd and 6: Josh Allen, MIP
Não existe o prêmio de Most Improved Player (MIP) de maneira oficial na NFL e portanto não vamos citá-lo na semana de prêmios (ou vamos, sei lá, podemos inventar regras). Então vou aproveitar para falar sobre aqui. Josh Allen provavelmente seria o eleito para tal prêmio, uma consolação mais do que merecida caso ele não seja o MVP. Allen saiu de 58,8% de passes completos para 69,2% – um salto faraônico. Nos números de touchdowns/interceptações, saiu de 20-9 para 37-10 – ou seja, ele saiu de 2,22 touchdown para cada interceptação para 3,7, um aumento de 1,5 (aproximadamente). É um salto pra lá de relevante e fazia tempo que não víamos isso.
Aliás, é esse o ponto desta descida. Nos últimos anos, perdemos a paciência com quarterbacks. Até o incrível Draft de 2004 (Eli/Rivers/Roethlisberger) era natural esperar pelo menos três anos até descer a lenha nos quarterbacks. Até então, os passadores chegavam um tanto quanto crus do college, sendo que a tendência do esporte universitário era correr como se não houvesse amanhã. Com a proliferação das spread offenses e um aumento no volume de passes dos quarterbacks, no melhor “quanto mais você faz, melhor fica”, os passadores começaram a chegar mais prontos na NFL. Por tabela, começou a ser comum que o quarterback fosse o Calouro Ofensivo do Ano, coisa mais rara anteriormente.
Como objeto de estudo, senão, vejamos: entre 1994 e 2003, nenhum quarterback foi eleito Calouro Ofensivo do Ano. Entre 2004 e 2013, seis. Então, por conta desse viés “eles estão chegando mais prontos”, por contraste, analistas e torcedores perderam a paciência mais cedo do que deveriam com Josh Allen. Eu, incluso, faço minha mea culpa aqui. Por tabela, estou esperando o terceiro ano de Daniel Jones e Drew Lock para tirar conclusões mais precisas – embora, sejamos francos, a tendência é mais negativa do que Allen em fins de 2019, visto que o elenco de apoio é pior do que Josh Allen tinha em Buffalo (e também porque Allen mostrou uma relevante evolução de 2018 para 2019, coisa que não vejo muito nos dois casos).
O ano de Josh Allen, portanto, é um paradigma muito importante para a análise de quarterbacks da NFL – a lição, creio, foi re-aprendida por todos nós.
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Horários do Wild Card Round:
SÁBADO (09/01)
15h05: Colts @ Bills
18h40: Rams @ Seahawks
22h15: Buccaneers @ Washington
DOMINGO (10/01)
15h05: Ravens @ Titans
18h40: Bears @ Saints
22h15: Browns @ Steelers
>> Chiefs e Packers folgam na primeira semana
3rd and 3: O que um running back tem que fazer para ser MVP?
Perguntado em uma live no meu YouTube, respondi: no mínimo, correr para 2000 jardas. Pois bem, Derrick Henry correu para 2000 jardas e não deve ser o MVP nesta temporada. A situação é um grande testemunho ao desprestígio da posição de running back nos últimos 10 anos e da máxima de que a NFL é uma liga de quarterbacks. Não é como se fato semelhante não tivesse acontecido também em outros esportes: na Era do Garrafão no basquete, o pivô era a estrela. Hoje, dificilmente você verá um jogador da posição sendo eleito como jogador mais valioso da liga – o mesmo se aplica aos running backs na NFL.
Se a linha dos três pontos e seu maior uso revolucionou o basquete, o mesmo pode ser dito do jogo aéreo com a formação shotgun e mais recebedores abertos que vimos dos perfeitos Patriots de 2007 em diante. Como dito, é uma liga de quarterbacks. A marca para isso costuma ser 2011, quando tivemos uma cacetada de passadores rompendo a barreira das 5000 jardas (Drew Brees, Tom Brady e Matt Stafford). O ano é conhecido como “O Ano do Quarterback”.
Mais jardas terrestres numa temporada – Ganhou o MVP?
1984, Eric Dickerson 2,105: Não <<
2012 Adrian Peterson 2,097 Sim
2003 Jamal Lewis 2,066 Não
1997 Barry Sanders 2,053 Sim, co-MVP
2020 Derrick Henry 2,027 ?
1998 Terrell Davis 2,008 Sim
2009 Chris Johnson 2,006 Não
1973 O.J. Simpson 2,003 Sim
> Eleito foi Dan Marino, com 48 passes para touchdown, mesma marca de Aaron Rodgers neste ano.
Curioso notar que estendendo a margem de erro do “ano do quarterback” para 2012, tivemos quatro running backs passando das 2000 jardas que foram eleitos MVPs se considerada a era moderna da NFL (1970-presente). É a metade. Também curioso notar a coincidência com 1984, guardadas as proporções que hoje é muito mais fácil chegar a 48 touchdowns e muito mais difícil chegar às 2000 jardas corridas – quando era o oposto naquele ano orweliano. Acho que essa frase, inclusive, resume as coisas. Se um quarterback tiver um ano minimamente acima da média, fica muito difícil que um running back seja eleito o MVP. Acho que a conclusão que temos é essa. Nos anos acima em que o running back do clube das 2000 jardas não foi eleito, acabou justamente sendo o caso, com Marino em 1984, McNair/Manning em 2003 e Manning novamente em 2009.
É uma pena que o feito de Derrick Henry não seja mais imortalizado com o MVP. Claro, eu posso estar errado e ele acabar sendo eleito – o que seria bacana, como dito. Mas é um Espírito da Arte da National Football League que, provavelmente, esse não seja o caso.
4th and 2: A maldição do MVP
A tendência é que Aaron Rodgers seja eleito o MVP pela Associated Press – o prêmio sai às vésperas do Super Bowl. A missão seguinte, então, seria quebrar a maldição de ser eleito o jogador mais valioso. NO século XXI, nenhum eleito a MVP venceu o Super Bowl. A última vez que isso aconteceu foi em 1999 com Kurt Warner no St. Louis Rams. Vamos à história então, com quarterbacks a não ser que notado.
2001 – Kurt Warner (STL), caiu no Super Bowl
2002 – Rich Gannon (OAK), caiu no Super Bowl
2003 – Steve McNair/Peyton Manning (TEN/IND), caíram nos playoffs da AFC
2004 – Peyton Manning (IND), caiu nos playoffs
2005 – Shaun Alexander, RB (SEA), caiu no Super Bowl
2006 – LaDainian Tomlinson, RB (SD), caiu nos playoffs
2007 – Tom Brady (NE), caiu no Super Bowl
2008 – Peyton Manning (IND), caiu nos playoffs
2009 – Peyton Manning (IND), caiu nos playoffs
2010 – Tom Brady (NE), caiu nos playoffs
2011 – Aaron Rodgers (GB), caiu nos playoffs
2012 – Adrian Peterson, RB (MIN), caiu nos playoffs
2013 – Peyton Manning (DEN), caiu nos playoffs
2014 – Aaron Rodgers (GB), caiu nos playoffs
2015 – Cam Newton (CAR), caiu nos playoffs
2016 – Matt Ryan (ATL), caiu no segundo tempo do Super Bowl
2017 – Tom Brady (NE), caiu no Super Bowl
2018 – Patrick Mahomes (KC), caiu nos playoffs
2019 – Lamar Jackson (BAL), caiu nos playoffs
Ou seja, em 19 ocasiões, em apenas 6 o MVP ao menos chegou ao Super Bowl – aproximadamente 30% – e em nenhuma delas venceu o título. Há alguma explicação lógica para essa maldição? Bom, uma que gosto diz respeito à essência do prêmio de jogador mais valioso. Para ele acontecer, o time tem que ser elevado de maneira exponencial por um indivíduo, geralmente com estatísticas fora da curva. Patrick Mahomes, Tom Brady e Peyton Manning conseguiram o prêmio em temporadas acima de 50 touchdowns. Lamar Jackson quebrou o recorde de mais jardas corridas por um quarterback. Adrian Peterson passou das 2000 jardas terrestres. Essas coisas não costumam se sustentar em pós-temporada, dado que o MVP acaba maquiando outros defeitos do time – em especial quando é quarterback, posição de maior impacto do jogo.
Aaron Rodgers entra nessa pegada em 2020? Bom, os Packers são favoritos na NFC a meu ver, mas é possível dizer que sim e como vocês sabem, playoffs são imprevisíveis. Se Green Bay cair pelo caminho, provavelmente isso acontecerá por conta de seu miolo de defesa contra o passe e jardas após a recepção – como visto contra os Lions e Danny Amendola há duas semanas – ou por conta da defesa terrestre como um todo, como visto várias vezes na última temporada e que não mudou muito em relação ao Festival Raheem Mostert na Final da Conferência Nacional de 2019-2020.
Essa é a natureza cruel do MVP da NFL: uma andorinha só não faz verão sempre e em playoffs com jogo de eliminação simples, a coisa complica ainda mais. Aquela espinha ou olheira que parecia tão bem maquiada às vezes acaba sendo exposta, até porque são os adversários mais fortes do outro lado. Os Packers fizeram quatro jogos contra times que terminaram o ano com campanha positiva – duas vitórias e duas derrotas contra Saints, Buccaneers, Colts e Titans. Nesses jogos, Rodgers teve 10-4 em touchdowns/interceptações, mas interessante notar que das 5 interceptações que teve no ano, 4 vieram contra times que estão na pós-temporada.
Vejamos se mais uma maldição é quebrada. Patrick Mahomes quebrou a Maldição da Capa do Madden – agora, é a vez de Rodgers com a maldição do MVP. Eventualmente ela será quebrada – por que não em 2020?
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