Há algumas semanas, um novo “terraplanismo” tomou conta do futebol americano: a ideia de que Taysom Hill, o terceiro signal caller do New Orleans Saints, tem condição de ser titular em tempo integral na NFL.
Tudo começou há cerca de um mês, quando o próprio Hill concedeu uma entrevista dizendo se enxergar como um franchise quarterback, inclusive afirmando que ele precisaria ir embora de New Orleans se a franquia não o visse assim. Em seguida, Mike Westhoff, ex-treinador dos times especiais dos Saints entre 2017 e 2018, deu coro às declarações do seu ex-jogador, declarando que “Hill lança a bola melhor do que Lamar Jackson”. Por fim, Mike Florio, jornalista do site ProFootballTalk, também entrou na conversa argumentando que “Hill será uma futura estrela na NFL”.
A discussão saiu das manchetes por um tempo, mas voltou à tona alguns dias atrás após Adam Schefter informar que os Saints pretendem aplicar a tender de 1ª rodada no seu quarterback reserva. Isso só é possível porque ele será um free agent restrito em 2020, portanto a franquia tem total controle sobre o seu destino.
Por sua vez, a decisão de New Orleans indica que Sean Payton o vê como um franchise quarterback, talvez como o futuro substituto de Drew Brees? Provavelmente não, até porque não há qualquer motivo razoável para pensar dessa maneira.
Hill é um “canivete suíço” – e só isso
Minha opinião é que é um desperdício dar a bola muitas vezes na mão de Hill se você pode entregá-la para Michael Thomas ou Alvin Kamara, dois playmakers muito mais dinâmicos e perigosos. Ainda assim, não nego que é divertido ver um quarterback atlético bloqueando, correndo com a bola, agarrando passes ou às vezes lançando em profundidade.
Hill é excelente como elemento surpresa no time dos Saints. Entre ataque e equipes especiais, ele atuou em 10 posições diferentes durante a temporada 2019, incluindo quarterback, wide receiver, running back/fullback, e tight end. E o melhor é que Sean Payton, criativo e inteligente como é, muda o uso e as atribuições do seu “canivete suíço” de jogo para jogo, fazendo com que os adversários nunca saibam exatamente o que esperar quando ele entra em campo.
Hill, contudo, só é tão efetivo por conta do fator surpresa que traz ao ataque. A partir do momento em que virar signal caller titular e os oponentes se preparem especificamente para enfrentá-lo, sua vantagem como arma secreta vai para o espaço.
Para piorar, ele não é um bom passador, o que obviamente é fundamental para qualquer quarterback titular na NFL. Hill lançou míseros 13 passes em três anos de liga, mostrando quase nenhuma capacidade de leitura e antecipação, além de pouca precisão e um braço mais ou menos. Suas tentativas em profundidade, por exemplo, são quase sempre underthrowns que flutuam demais no ar, dando chance para os defensores se recuperarem na jogada. Até mesmo seu passe mais famoso, a conexão de 50 jardas para Deonte Harris contra o Minnesota Vikings no Wild Card passado, foi um lançamento curto demais.
Outro problema é acreditar que Hill, na condição de quarterback atlético, possa ter o impacto em um esquema de jogo terrestre montado ao redor de si igual ao de Lamar Jackson no Baltimore Ravens. Um simplesmente não é igual ao outro. O signal caller dos Saints não é tão veloz, ágil ou elusivo quanto Lamar – e nem tão bom passador, ao contrário do que afirmou Mike Westhoff. Hill é mais um corredor de força e trombador, quase ao estilo de um fullback. Em termos físicos, ele é uma espécie de meio termo entre Case Keenum e Tim Tebow – mais atlético que o primeiro, menos que o segundo.
Enfim, não é razoável tentar replicar com Taysom Hill aquilo que os Ravens fizeram com Lamar Jackson. A franquia que tentar fazer isso provavelmente vai acabar com um quarterback forte correndo várias vezes de cara contra um muro de defensores.
