Momentos após a seleção de Baker Mayfield, havia o sentimento em alguns torcedores do Cleveland Browns de que tal movimento foi ruim, pois a primeira escolha geral se assemelhava a Johnny Manziel, antigo quarterback da equipe que fracassou após ser escolhido na primeira rodada no Draft de 2014. A vergonha deste sentimento será compartilhada com várias pessoas que tiveram a ousadia de comparar Baker Mayfield com Johnny Football.
Muitas dessas comparações aumentaram depois de Mayfield fazer gestos obscenos em direção a sideline de Kansas, após os jogadores não cumprimentarem-no durante o coin toss, além de ambos terem tidos problemas com a polícia em suas universidades. A comparação preguiçosa também se dava pela altura semelhante entre os dois: enquanto Manziel tinha 1,80m, Mayfield possui 1,82m.
Mas o que se esqueceram de comparar foi exatamente a principal característica que fez de Manziel um fracasso na NFL: a mentalidade. Um habitué das festinhas, Manziel chegou a treinar bêbado quando já era profissional; Mayfield possui a mentalidade oposta, possuindo tanta competitividade dentro dele que foi capaz de apontar e encarar para Hue Jackson – quando este virou adversário – depois fazer grandes jogadas, como quem dissesse com os olhos “você é uma fraude em não me deixar ter sido o quarterback titular desde o começo”. Para alguns comentaristas, uma total falta de respeito com o ex-treinador; para outros, apenas diversão. Para os Browns, exatamente a mentalidade que precisavam.
Baker, como prospecto
Além de mentalidade e personalidade fortes, Mayfield era um ótimo prospecto, tendo como principal qualidade sua capacidade de estender as jogadas, seja fora ou dentro do pocket. Baker conseguia fazer progressões completas dentro do pocket, sempre com a cabeça levantada escaneando o fundo do campo e, ao sentir qualquer sinal de perigo, tinha a habilidade de conseguir escapar para fora do mesmo, conseguindo ganhar jardas com as pernas. Na jogada abaixo, ele consegue mostrar exatamente isso, mesmo com a pressão chegando por dentro e por fora: o quarterback mantém os olhos levantados e consegue encontrar o wide receiver Cee Dee Lamb para o first down em momento crítico da partida.
— ALL22ProFootball (@All22_PF) January 22, 2019
Na jogada abaixo contra Auburn, desde o momento que Mayfield recebe o snap até o momento que faz o passe se passam 11 segundos. É uma daquelas jogadas que, enquanto você está assistindo, você percebe que o garoto é especial nessa habilidade.
— ALL22ProFootball (@All22_PF) January 22, 2019
Na próxima jogada, Baker lança uma bola de 60 jardas e acerta o recebedor em ritmo para fazer a recepção e, consequentemente, o touchdown. Repare como além da bola ser lançada longa, ela também possui bastante velocidade, o que acaba impedindo o defensor de fazer qualquer jogada em cima dela.
Double posts catches FS cheating. Layered route concepts can work vertically or horizontally. Sunday throw. #BakerMayfield pic.twitter.com/dR2wO9oFBS
— Kyle Crabbs (@GrindingTheTape) October 23, 2017
Cemitério de quarterbacks em Cleveland
Todos nós lembramos da ‘fábrica de tristeza’ chamada Cleveland Browns antes de Baker Mayfield chegar. Desde 1999, foram 31 quarterbacks que iniciaram uma partida pela organização, uma impressionante média de 1,6 quarterbacks por temporada. Uma lista intermináveis de busts, como Tim Couch (primeiro jogador escolhido no draft de 1999), Brady Quinn (primeira rodada em 2007), Brandon Weeden (primeira rodada de 2012), Johnny Manziel (primeira rodada de 2014), além de alguns jogadores medíocres que vieram como free agent ou escolhidos mais tarde no draft – Derek Anderson, Seneca Wallace, Jason Campbell, Trent Dilfer, Josh McCown, Brian Hoyer e vários outros.
Por isso, os Browns precisavam de um quarterback que tivesse essa personalidade extremamente forte como Mayfield – e ele sabia disso. Em sua entrevista coletiva no Combine, quando perguntado sobre a possibilidade de ser o próximo quarterback de Cleveland, Baker respondeu: “eu acho que se há alguém para transformar essa franquia, essa pessoa seria eu. Eles possuem as peças certas, eles só precisam de um cara, um quarterback que faça a diferença.”
Ba-ker May-field!
Ba-ker May-field!
Era o que cantavam os torcedores dos Browns após a primeira vitória em 2 anos, após Baker Mayfield entrar substituindo um machucado Tyrod Taylor para bater os Jets por 21 a 17. Ele não foi só um bom novato na temporada: ele foi a salvação de uma cidade angustiada e envergonhada pelas inúmeras derrotas.
A temporada de Baker Mayfield
Antes de mais nada, precisamos separar a temporada em duas partes – antes e depois de Hue Jackson. Com o ex-treinador ainda no comando, os Browns venceram apenas duas partidas em oito e, após a demissão, os Browns venceram mais cinco partidas de oito disputadas.
Muito disso se passou pela forma como o ataque era gerenciado por Todd Haley e Hue Jackson. Nas oito partidas com os dois, os Browns tiveram uma média de 342 jardas e 20,6 pontos por partida, tendo ainda quatro prorrogações nesses oito jogos para aumentar ainda mais a média. Após a demissão de Jackson, Gregg Williams assumiu interinamente como head coach e Freddie Kitchens como coordenador ofensivo: com o novo comando, o time subiu a sua média de jardas para 395 jardas e 25,1 pontos por partida, sem nenhum jogo indo para a prorrogação para puxar a média.
Além dos números mostrarem claramente uma evolução entre os dois comandos, outra estatística que chama a atenção é a de jardas por jogada. Sob a batuta de Jackson, os Browns possuíam uma média de 4,86 jardas por jogada, enquanto com Kitchens a média sobe para 6,9 jardas. Para efeito de comparação, as 4,8 jardas colocariam os Browns na terceira pior marca da liga, ficando empatado com Jacksonville Jaguars; já as 6,9 jardas seriam suficientes para liderar a NFL, ultrapassando as 6,7 jardas dos Chiefs de Mahomes.
Essa mudança ficou ainda clara ao assistir os jogos dos Browns – Mayfield passou a arriscar mais passes longos e também a ter mais liberdade como signal caller. Na semana 14, contra os Panthers, em sua primeira jogada na partida, Baker realizou um play-action e conectou com Breshad Perriman, que poderia ter marcado o touchdown caso tivesse mantido o equilíbrio.
— ALL22ProFootball (@All22_PF) January 23, 2019
Saquon Barkley teve também uma temporada fantástica e mereceu consideração ao prêmio, mas não há estatística que traduza o feito do quarterback de Cleveland. Mayfield conseguiu dar esperança para uma cidade amargurada e magoada pelo futebol americano por anos a fio, e isso é maior que qualquer número em uma planilha.







