A primavera chegava e as horas de luz eram cada vez maiores naquela gramado na Georgia. Com o sol se ponto no campo, terminava mais um treino. Quem ali estava achou que nunca mais sentiria exaustão após correr num campo de 100 jardas. Achou que não teria nenhuma gota de suor sendo derramada sobre uma marcação de jarda. Neste ano, tiveram mais uma chance. Eles treinavam na Georgia porque na Flórida, de onde o time supostamente deveria ser no dia-a-dia, as leis trabalhistas lhes proibiria de praticar – não havia seguro de saúde para os jogadores. Naquele momento, isso não lhes importava e nem parecia uma notícia ruim ou o presságio de nada negativo. Mas era.
Nesta terça-feira, a Alliance of American Football teve suas atividades suspensas e, por que não dizer, encerradas. Na sequência, ainda nesta semana, os jogadores foram liberados para assinar com qualquer equipe da NFL. Isto, na prática, colocava fim a uma temporada que durou apenas oito jogos. O ano começou com pompas: os números de audiência da liga chegaram a ser superiores que um jogo da NBA e, semanalmente, batiam partidas da NHL e campeonatos de golfe. O que aconteceu?
É difícil achar respostas nesta altura do campeonato. Ou da falta do campeonato, para ser mais específico. A AAF é uma liga que não foi. Sua contabilidade estava carcomida desde o início. O cancro financeiro deu a oportunidade para um bilionário entrar na jogada e encerrar as partidas como um garoto pega a bola que lhe é de sua propriedade e a leva para casa ao início da noite. Os jogadores não tinham seguro. Na Semana 2, os criadores da liga, Charlie Ebersol e Bill Polian, pediram ajuda para Tom Dundon – o ricaço de Dallas que também é dono do Carolina Hurricanes, equipe da NHL. Dundon injetou dinheiro e sem essa grana, não haveria mais jogos. Um mês depois, ele puxou o plug da tomada. 70 milhões de dólares de prejuízo para Dundon foi a justificativa aparente. Nas entrelinhas e nos bastidores, conforme reportou Albert Breer no Twitter, Dundon só colocou essa grana na Alliance porque queria ser proprietário de uma tecnologia de apostas esportivas que a liga estava desenvolvendo.
A história é, de fato, mal contada. Afinal de contas: por que ele colocaria essa grana na liga e, cinco semanas depois, encerrasse suas atividades unilateralmente? Dá para saber se o negócio é viável antes de colocar a grana. É um princípio básico dos negócios. A parte da tecnologia estar em desenvolvimento é bem verdade: Eberson chegou a se referir assim sobre a liga em seu início. Como um laboratório para muitas coisas. Então, de duas uma: ou Dundon é burro ou fez a compra da liga no meio da temporada para ter sua tecnologia. Cinco semanas depois, puxa da tomada para estancar as perdas.
Não conhece muito da AAF, leia mais:
🏈 PRO! | Assim como fez com outras ligas, NFL pode aproveitar muito da AAF
Um guia para você se divertir com a AAF, a nova liga de futebol americano
70 milhões de dólares parece muito dinheiro e de fato é – mas em compensação, a tecnologia pode render bilhões de dólares na medida em que mais Estados americanos legalizarem as apostas esportivas. Nova Jersey já o fez, por exemplo. Outros devem seguir. Nos EUA, é crescente o movimento do público em sites de apostas.

Ante esse apocalipse, indo direto na raiz do problema: por que não houve viabilidade financeira?
Porque nunca vai haver. O prejuízo de Dundon com oito times em oito semanas é menos da metade da folha salarial de um dos 32 times da NFL. Na prática, a NFL é um gigantesco monopólio e não há como competir contra ela. Para início de conversa, uma das grandes graças do futebol americano é sua escassez. A primeira semana da AAF teve bons números nos Estados Unidos e uma centena de perfis cobrindo a liga surgiram nas redes sociais brasileiras – mesmo que não houvesse transmissão em nenhuma televisão daqui.
Semanas depois, não se via muita gente falando sobre o assunto. Fiz uma pergunta no twitter sobre a liga e se as pessoas ainda estavam assistindo. Muitas já tinham deixado de lado por outros esportes ou atividades. A dificuldade de achar um lugar para assistir certamente colaborou, mas fato é: os jogos da AAF nada mais eram do que uma pré-temporada da NFL, em termos técnicos. Afinal, eram os mesmos jogadores que ali estavam em anos anteriores. A diferença, óbvia, é que os jogos eram competitivos. Mas não chegam perto do nível de entretenimento da poderosa de Roger Goodell.
Não que fosse inassistível: certamente prefiro uma partida de uma liga menor (Minor League) de futebol americano a alguns outros esportes ou programas na televisão. Mas a beleza da novidade aos poucos foi fazendo a maquiagem escorrer e as pessoas perderam o interesse. Tanto aqui como nos Estados Unidos. Com menos jogos em TV aberta nos EUA – a CBS estava focada no March Madness – a situação foi ficando cada vez mais grave quanto à viabilidade financeira. A impossibilidade de jogadores que estão sob contrato da NFL poderem vestir o uniforme de uma das oito franquias da AAF foi decisiva, mas não o principal fator.
Afinal de contas, não era tão imprevisível assim que em duas semanas o dinheiro acabaria. É matemática a questão. Não estamos falando de salários que flutuam semana a semana, eles eram fixos. Daí a estranheza. A inconsequência e o “jeitinho” semana a semana fizeram com que sonhos de centenas de atletas fossem por água abaixo. Alguns, como Garrett Gilbert, encontrarão refúgio como reservas na NFL – Gilbert, do Orlando Apollos, foi o melhor quarterback da liga. Outros, como Johnny Manziel, terão que esperar pela primeira temporada da XFL no ano que vem.
Seja como for, é triste. A AAF, no fundo, foi uma liga natimorta. Uma liga que não foi.
Exclusivo de nossos assinantes – assine agora, teste grátis por 7 dias ou assine com 30% de desconto
Podcast PRO! | Giants, Patriots ou Chargers: pra onde pode ir Rosen?
Podcast PRO! | Ryan Tannehill vai ameaçar a titularidade de Mariota?
PRO! | Draft simulado, Deivis: Muitas mudanças após a free agency
PRO! | Texans e Vikings falham em adereçar sua maior fraqueza na free agency
PRO! | A rica Free Agency dos defensores é resposta aos ataques potentes de 2018?
PRO! | 7 Perdedores da Free Agency 2019







