Quando crianças, costumamos ouvir de nossos pais quando cometemos um equívoco: “aprenda com seus erros”. Nassim Nicholas Taleb é um estatístico que ganhou fama por seus ensaios e livros voltados para a tomada de decisão humana diante da incerteza. Em seu best-seller, denominado Antifrágil, Taleb desenvolve e dedica-se a explicar situações do mundo a partir do conceito da antifragilidade – que, para criar familiaridade com você, querido leitor, assemelha-se ao que ouviu de seus pais quando criança.
Resumidamente, a antifragilidade é uma característica de indivíduos e sistemas orgânicos que representa a capacidade de sofrer leves danos – que surgem a partir da aleatoriedade do mundo – e sair mais forte da situação. Nesse processo, os erros e o estresse agudo (aquele que vem de uma vez só) são processos recorrentes que definem sua carga de antifragilidade.
Quer um exemplo? Pegue um corretor da bolsa. Aquele que vive à mercê dos números e das análises grafistas está totalmente exposto à volatilidade, pois os eventos imprevisíveis do mundo não podem ser calculados como a fórmula de cálculo de risco sugere. Já aquele que é humilde perante os riscos e toma decisões que não coloquem em risco todo seu patrimônio (o chamado método Barbell), é um investidor antifrágil.
Ok, você não aguenta mais ouvir disso e está quase comprando o livro para fazer eu parar de falar sobre o assunto, pois a principal pergunta ainda paira sobre o ar: como o conceito de antifragilidade de Taleb pode relacionar-se com o salary cap da NFL e nos ajudar a entender o contexto atual da liga?
O estresse do salary cap e as estratégias atuais
Lembra quando acima mencionei o estresse agudo como melhor para a antifragilidade? Você deve ter questionado-se um pouco do motivo. Bom, primeiro é necessário entender que há dois tipos de estresse: o agudo e o crônico. O agudo “vem de uma vez” e neurobiólogos mostram que, inclusive, ele é necessário. O crônico possui uma intensidade menor, mas está lá te martelando, dia por dia (não a toa, um método de tortura comum é deixar uma gota de água batendo continuamente em cima da cabeça do torturado até que ele enlouqueça).
O salary cap, na atualidade, pode ser o estresse crônico ou o agudo; tudo depende da tática abordada pela franquia. Se a diretoria não conseguir realizar um bom controle de salários, o teto orçamentário estará sempre sufocando os movimentos em busca do título e começa a se tornar um estresse crônico que, como vimos, não é saudável. Afinal, é justamente essa a intenção da restrição, forçar as equipes a terem bons projetos para se manterem no topo, se não conseguirem – e frequentemente não conseguem – passam por tempos ruins e a igualdade é preservada.
Hoje, na NFL, o estresse agudo é mais comum do que se imagina. Qual a “fórmula da vitória” atual? Escolha um quarterback calouro no Draft e gaste tudo na free agency enquanto ele não se torna o novo jogador mais bem pago da liga; certo? Isso é um estresse agudo claro, pois a franquia só sofrerá o baque quando o dia do contrato chegar e, a partir daí, o agudo pode se tornar em crônico se a folha salarial não for bem gerenciada, agora que seu principal jogador toma cerca de 20% do espaço disponível.
Isso se torna muito claro quando seu quarterback não corresponde ao valor investido, engessando suas possibilidades e tornando o dia a dia do General Manager quase insuportável – e, como vimos, a irritação crônica não é desejável e acompanha grandes problemas e pode influenciar péssimas tomadas de decisões.
Ok, mas há exemplos reais?
Tudo bem, você provavelmente concorda com o que eu disse até o momento e trazendo a teoria de Taleb para o funcionamento do salary cap o entendimento da questão tornou-se mais fácil. Somente um bom controle da folha salarial pode impedir o estresse crônico, mas controlá-la bem significa manter-se no topo por vários anos e a antifragilidade começa a se mostrar aparente.
Porém, há algum time assim? Sim – e você sabe quem eu vou mencionar na próxima linha.
O New England Patriots é o maior exemplo de antifragilidade da NFL. Fugindo apenas do espectro salarial, a franquia soube absorver e aprender com seus erros para se tornar cada vez mais forte e uma presença constante nos times favoritos ao título no início da temporada.
- Escândalos e polêmicas (spygate, deflategate, brigas de Brady e Belichick)? Voltaram mais fortes.
- Dois Super Bowls perdidos para os Giants? Se recuperaram e conquistaram três.
- O maior quarterback da história que, em tese, deveria corroer seu teto salarial? Não foi problema também.
A mentalidade estoica de Bill Belichick sempre auxiliou no processo e no controle do elenco em todos os derivados desse. O famoso “Do Your Job” é mais do que um mote. É a representação da antifragilidade dos Patriots. A franquia está no topo há 19 anos e não existe segredo escondido. É uma mistura de Marco Aurélio e Taleb.
Belichick sempre esteve nos ensinando: aprenda com seus erros e levante-se deles mais forte (continuar insistindo no mesmo erro é uma atitude de perdedor); os “galhos podres” e os jogadores que querem salários exorbitantes? Corte sem dó, é importante possuir uma folha salarial controlada se seu pensamento é o longo prazo.




