Curti: Depois de Nagy, um terreno fértil para Fields mostrar quem é

As tendências ofensivas dos Bears na temporada passada pouco faziam sentido, com chamadas questionáveis e Justin Fields sendo mais atrapalhado do que ajudado. Mesmo que ele tenha tido grande parcela de culpa, a boa notícia é que o terreno em 2022 será mais agradável para que ele se desenvolva

Quando analisamos o Draft da NFL, é comum usarmos a expressão “prospecto” em vez de jogador. Você já deve ter reparado nisso em alguma oportunidade. É uma palavra mais adequada pelo fato de que estamos prevendo, prospectando o desempenho do atleta na transição do nível universitário para o profissional.

Não é só uma mudança de nível técnico. É uma mudança de time, muitas vezes de sistema, de comissão técnica. No caso do quarterback, uma mudança de sintonia com os recebedores, com o costume de ouvir outra voz no capacete chamando as jogadas. Sem contar, claro, o óbvio da mudança de nível técnico já mencionada.

O jogo na NFL “passa” muito rápido, muito mais rápido do que o jogo universitário. As defesas são mais físicas, mais velozes, mais complexas. Por óbvio, dores de crescimento são esperadas no primeiro ano e às vezes até mais além.

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Justin Fields passou por essas dores. Não era uma semente ruim. Nem uma semente perfeita, tanto que em praticamente nenhum lugar você lia que ele era o melhor prospecto do Draft 2021 na posição de quarterback. Tampouco lia que era o pior. Essa semente, porém, caiu num dos piores ambientes possíveis para germinar.

Na semana passada, de férias, estive no Chile e passei por algumas vinícolas. Aprendi coisas que não tinha ideia, mas um detalhe me chamou a atenção. Perto de Santiago, a capital, há um vale onde a temperatura é dois graus mais fria do que na cidade e constantemente há neblina. São as condições ideais para que o vinho branco seja produzido. A semente da uva quando cai ali, germina que é uma beleza para a produção do vinho branco.

Se você fizer o mesmo no Deserto do Atacama, certamente o resultado não será o mesmo. Ou na Patagônia, ou no seu quintal. O ambiente onde a semente cai depois do Draft é importante. Veja: não é clubismo nem passar pano. Justin Fields foi mal no ano passado e num nível aquém do que qualquer analista poderia imaginar. Ninguém tem menos de 60% de passes completos e mais interceptações do que touchdowns apenas por culpa dos outros.

Mas é inegável que a ajuda faltou. Para começar, Fields mal teve repetições como deveria no training camp. Matt Nagy, então head coach, sequer abriu a possibilidade de uma disputa de posição entre Andy Dalton (!!) e Fields antes da temporada. Considerando os principais problemas de Fields – fixar-se no alvo demasiadamente em alguns momentos e sentir mal a pressão – essas repetições fizeram falta. Tanto é que uma das primeiras medidas da Administração Eberflus neste ano foi de dar toda repetição possível a Fields nos minicamps. Os reservas mal tocam na bola.

Inimigos do Calouro

É sempre importante, quando falamos de quarterbacks escolhidos na primeira metade da primeira rodada, que o cara não caiu de paraquedas ali, alguma coisa os times e olheiros viram para que ele fosse bem cotado[foot]Claro que exceções existem, como Blake Bortles no top 5 ou Daniel Jones na sexta escolha geral, mas no caso do ano passado todos os quarterbacks tinham nota para serem escolhidos onde foram[/foot].

No caso de Fields, a mobilidade e a parte atlética como um todo eram grandes trunfos. Em vez de usar isso a seu favor, num modelo parecido que o Carolina Panthers fez com Cam Newton em 2011, Matt Nagy parecia querer escancarar que Fields fora uma escolha da diretoria e não da comissão técnica.

Um exemplo: play-action à rodo para dar tempo a mais e leituras mais simples para o quarterback, especialmente fora do pocket. Nesse exemplo dos Panthers com Cam, o time foi 8º em porcentagem de play-action em 2011. Os Bears foram 25º na temporada passada.

O festival de bizarrices nas tendências de Matt Nagy seguem e seguem e de antemão peço desculpas ao torcedor dos Bears, porque certamente ele vai querer quebrar a tela do celular ao ler o que segue. O time esteve entre os 10 que menos fizeram motion antes do snap para confundir a defesa, foi o 27º em porcentagem das jardas que vieram depois da recepção, 18º em max protection (mesmo com Fields sendo uma pinhata em vários jogos) e a cereja do bolo: não tinha o menor interesse de correr por dentro dos tackles, sendo que os iOLs eram o ponto forte do plantel da linha ofensiva. 25º em corridas pelo meio.

Também em nada ajudou que Chicago praticamente não rodou jogadas com cinco recebedores para que Fields soltasse rápido a bola. Tampouco que o quarterback tenha tido quase 10 jardas no ar por passe. O roteiro básico do ataque de Nagy eram corridas por fora dos tackles, pouco play-action, tijoladas no fundo do campo e terceiras descidas que empacavam e faziam o ataque sequer desenvolver ritmo.

Por outro lado, embora Fields tenha telegrafado vários passes e tenha errado bastante, foi nítida sua evolução no processamento do jogo ao longo da temporada. Longe de ser o suficiente, mas também longe de ser caso perdido.

O que fazer para melhorar?

Muito foi falado que Chicago fez uma péssima intertemporada por ter pouco feito no corpo de recebedores, mas não creio ser o pior dos mundos. Foi cristalino como o mercado de wide receivers estava com inflação mais alta do que o Brasil em 1993. Gastar rios de dinheiro sem ter um horizonte mais claro de Quem é Justin Fields? poderia ser considerado irresponsabilidade.

A nova diretoria optou em esperar para gastar e, principalmente, ir de boa, aos poucos. Até porque hoje[foot]via Spotrac[/foot] o time tem inacreditáveis 93 milhões para gastar na Free Agency de 2023. Mesmo que a inevitável renovação de Roquan Smith venha, ainda vai sobrar muita grana.

Primeiro o terreno precisava ser limpo. É o que deve ser feito. Depois, com uma comissão técnica mais inteligente que dê rodinhas para a bicicleta antes de empurrá-la ladeira abaixo, podemos ter uma visão mais clara de Justin Fields depois do ano perdido que foi 2021.

Os Bears, com Luke Getsy chamando o ataque, devem correr bastante (mesmo) com a bola, rodar o play-action, priorizar passes curtos para tirar a bola das mãos de Fields o quanto antes e vez ou outra, mirar o fundo do campo. Ainda, considerando a raiz de West Coast Offense de Getsy, as jardas após a recepção devem ser mais constantes do que o festival de rotas isoladas e que não conversavam entre si que Chicago teve no ano passado.

Não espere que Fields quebre o recorde de jardas por um quarterback dos Bears e rompa a barreira das 4000 jardas. Tampouco é difícil imaginar que a equipe tenha campanha positiva nesta temporada. Mas ao menos um terreno fértil para a semente germinar e dar frutos em 2023 é finalmente algo possível.

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