
De antemão, que fique claro: ser questionado não significa estar em hot seat para 2025, nem que este texto queira reduzir o Head Coach dos 49ers a algo menor do que a notoriedade que ele merece.
A história da NFL é repleta de indivíduos que, por motivos diversos — desde melhorias na qualidade de equipamentos, expansão da liga, acordos com a TV, relação profissional entre jogadores e franquias, inclusão social, suporte comunitário até o avanço técnico e tático do jogo — tiveram impacto decisivo e transformaram o futebol americano nesse espetáculo que conquistou nossos corações.
No aspecto de campo, o qual é o foco do artigo, é claro que as tendências responsáveis pelos avanços táticos e culturais do jogo eram transmitidas a outros técnicos. Se olharmos a história da NFL através do conceito de “árvores táticas”, entenderemos que o êxito ao longo dos anos não foi obra do acaso. Os técnicos vencedores de Super Bowls na década passada vieram de duas árvores específicas: Walsh e Parcells. Ambos haviam obtido sucesso em décadas anteriores e foram responsáveis por criar culturas vencedoras e conceitos táticos — ofensivos no caso de Walsh e defensivos no caso de Parcells.
No fim da mesma década, surgiu uma nova linhagem vitoriosa, que tem ramificações na West Coast Offense de Bill Walsh. Hoje a conhecemos como a árvore de Shanahan, que inclui nomes como Sean McVay, Matt LaFleur e Kyle Shanahan, filho de Mike Shanahan — não, a árvore não tem esse nome devido ao técnico dos 49ers.
O gênio ofensivo
Crescido em um ambiente futebolístico altamente competitivo, Kyle Shanahan teve contato desde cedo com estratégias de alto nível, desenvolvendo uma compreensão profunda do jogo. Essa vivência lhe deu uma visão sistêmica: não se trata apenas de desenhar jogadas, mas de elaborar estratégias ofensivas completas, considerando as interações entre linemen, running backs, quarterbacks e recebedores.
Especialista no outside zone run scheme, esquema de corrida lateral que explora espaços deixados pela defesa, Shanahan demonstra habilidade em coordenar a linha ofensiva e o running back de forma precisa. Além disso, utiliza play-action passes de maneira excepcional, confundindo defensores e criando oportunidades para passes médios e longos. Movimentos e formações pré-snap, como motion e shifts de recebedores, ajudam a identificar coberturas e geram vantagens espaciais, tornando o ataque imprevisível.
Shanahan também se destaca no desenvolvimento de quarterbacks. Foi fundamental para que Matt Ryan alcançasse temporadas históricas e extraiu o melhor de Jimmy Garoppolo nos 49ers. Sua filosofia valoriza leitura de jogo, tomada de decisão rápida e quarterbacks capazes de executar múltiplas opções dentro do sistema.
Desde sua chegada em 2017, transformou os 49ers em uma equipe competitiva. As temporadas de 2019 e 2023, que culminaram no Super Bowl LIV, mostraram sua capacidade de montar ataques versáteis, integrando corridas, passes e play-action de forma harmônica. Sua habilidade em adaptar estratégias aos talentos disponíveis também ficou evidente, maximizando o potencial de cada jogador.
Outro ponto forte é a flexibilidade tática. Ele ajusta planos conforme o adversário e prepara a equipe com base em estudos profundos de tendências ofensivas e defensivas. Esse detalhismo na preparação semanal é marca registrada de sua genialidade.
Shanahan não se limita a esquemas tradicionais. Busca constantemente evoluir o jogo ofensivo e inspira outros técnicos, influenciando como a NFL enxerga ataques modernos. A combinação de visão tática, inovação e capacidade de desenvolver jogadores o consolidou como um dos treinadores mais respeitados da liga.
O questionamento: a falta de êxito
O principal questionamento sobre Kyle Shanahan diz respeito à consistência em jogos decisivos, sobretudo nos playoffs. Apesar de conduzir os 49ers a partidas importantes, derrotas em momentos cruciais levantam dúvidas sobre sua capacidade de decidir sob pressão. A genialidade tática, embora visível, nem sempre se traduz em vitórias em jogos de eliminação direta. O fato é: Shanahan é um gênio, mas ainda não venceu nos momentos decisivos. Fora isso, perdeu em ocasiões em que tinha vantagens consideráveis.
Outro ponto é a dependência de jogadores-chave. Times de Shanahan, especialmente os 49ers, mostraram vulnerabilidade quando atletas essenciais — como quarterbacks ou running backs — se lesionaram. Isso levanta a dúvida se o sistema ofensivo mantém a mesma eficácia sem talentos de elite.
Embora a criatividade ofensiva seja uma de suas marcas, algumas escolhas de playcalling são questionadas. Em situações de pressão ou finais apertados, determinadas jogadas soam previsíveis ou arriscadas, deixando a equipe suscetível a defesas bem preparadas.
O desenvolvimento de quarterbacks jovens também gerou críticas. O caso de Trey Lance mostrou as dificuldades em equilibrar o processo de formação com a pressão por resultados imediatos. Esse dilema expôs falhas de timing e gestão estratégica.
A percepção externa sobre Shanahan é complexa. Torcedores e mídia oscilam entre elogios à genialidade ofensiva e críticas às derrotas em jogos-chave. A expectativa criada por seu estilo inovador aumenta a pressão a cada revés.
Por fim, embora seja brilhante no planejamento, adversidades imprevistas — como lesões, mudanças rápidas de esquema defensivo ou condições externas — testam sua capacidade de ajuste imediato. Esses cenários mostram que até um gênio tático está sujeito as falhas de execução e às limitações do jogo.
Cenas dos próximos capítulos
A trajetória de Kyle Shanahan é um paradoxo de manual: o homem que inventa ataques que parecem engenharia da NASA, mas que em momentos decisivos acaba se complicando e fazendo escolhas equivocadas. Seus esquemas são estudados, copiados e até invejados, mas o anel de campeão insiste em passar batido como se tivesse motion próprio.
O ponto não é a falta de genialidade, e sim a dificuldade em traduzi-la nos jogos que definem legado. A NFL pode adorar inovação, mas só ergue estátua para quem levanta o Lombardi — e diga-se de passagem, o pedigree já recompensou Sean McVay e Gary Kubiak com anéis.
No fim das contas, Shanahan tem duas opções: consolidar-se como arquiteto de uma dinastia ou ficar marcado como o “gênio ofensivo” que desenhava obras-primas, mas tropeçava na hora de emoldurá-las. A diferença entre esses dois destinos? Talvez apenas uma jogada bem chamada no quarto período de fevereiro.
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