É chegada a hora de coroarmos o campeão nacional do College Football. Não tem melhor de 5, melhor de 7. Na madrugada de segunda para terça você poderá saber quem é o campeão nacional do futebol americano universitário. O grande palco está armado em Glendale, Arizona, no University of Phoenix Stadium. Quem leva? Quais os principais duelos que podem decidir a partida? Quais estatísticas devemos prestar atenção?
Se você gosta de David contra Golias, este é o jogo para você. Se você gosta de um time montado na inteligência e com anos de recrutamento, idem. Se você gosta de um titã do College Football, mais ainda. Clemson é a Aliança Rebelde, Alabama é o Império Galático. Será que DeShaun Watson conseguirá ser Luke Skywalker e ser preciso para destruir a Estrela da Morte de Nick Saban?
📝 O que? College Football Playoff National Championship presented by AT&T: #1 Clemson Tigers vs. #2 Alabama Crimson Tide
🌎 Onde? University of Phoenix Stadium – Glendale, AZ
🕛 Quando? 23h30 (horário de Brasília)
📺 Onde assistir? ESPN | Watch ESPN
No final das contas, é o que o Comitê do College Football Playoff queria quando montou seu ranking final: o número #1, Clemson, invicto, contra o #2, Alabama, da toda-poderosa SEC. Não tem como dizer que ambos não se provaram legítimos finalistas do College Football. Na primeira semifinal, o Orange Bowl, Clemson mostrou a força de sua defesa contra Baker Mayfield e o ataque mais quente do país com Oklahoma – a unidade defensiva dos Tigers não cedeu nenhum ponto no segundo tempo. Alabama, por sua vez, massacrou sem dó nem piedade o campeão da Big Ten, Michigan State, por 38-0 numa derrota embaraçosa para o time de Mike Dantonio. E agora, o que esperar? São apenas 15 confrontos entre os dois times, o último em 2008 (portanto com equipes completamente diferentes), com vitória por 36-10 para o time de Nick Saban. Vejamos o que esperar do 16º e mais decisivo embate.
TL;DR
A versão curta do preview
Alabama é uma potência e tem talento em praticamente todas as posições; Confia num jogo terrestre eficiente que irá querer controlar o destino da partida – e o relógio como consequência. Ao mesmo tempo, Clemson precisa forçar terceiras descidas longas para que Jake Coker, quarterback de Alabama, tenha problemas; Os Tigers só irão conseguir fazer isso se pararem Derrick Henry, vencedor do Heisman, a ganhos para nenhuma jardas ou perda de jardas. Do outro lado, para Clemson vencer, é necessário que o time consiga jogadas para mais de 20 jardas no ataque; isso frustra o pass rush de Alabama e abre o jogo completamente.
Três matchups decisivos
Já falamos bastante sobre as duas equipes em nossos previews das semifinais do College Football Playoff (leia mais sobre Clemson aqui e sobre Alabama aqui, sobretudo os jogadores para o Draft, como as equipes chegaram entre as quatro primeiras do Comitê e etc). Sendo assim, vamos focar este texto em outras coisas mais relevantes para este jogo. Um dos fatores mais importantes do futebol americano – e que às vezes é subestimado – são os confrontos individuais dentro de uma partida. Pode ser um jogador contra outro – por exemplo um wide receiver talentoso contra um cornerback físico – um jogador contra uma unidade – um quarterback pocket passer contra um front seven – ou uma unidade contra outra – uma linha ofensiva contra uma linha defensiva. Seja como for, são microcosmos que podem ter influência direta no resultado. Aqui, separamos três – se você estiver com preguiça de ler o preview completo (ou estiver sem tempo), preparamos um box com ele resumido ao lado.
Linha ofensiva de Clemson e DeShaun Watson (QB, Clemson) vs. Front Seven (DL, LB) de Alabama
Se há um quarterback com característica de ameaça-dupla no College Football, esse cara é DeShaun Watson, de Clemson. Já mencionamos no preview do Orange Bowl (semifinal contra Oklahoma) seu poder de fogo nos dois lados da bola – notoriamente as 420 jardas aéreas contra Boston College e as 145 jardas terrestres contra Oklahoma no dia 31 de dezembro. Watson é apenas o terceiro jogador na história da FBS a ter passado para pelo menos 3500 jardas e corrido para 1000 numa dada temporada.
Neste jogo em específico, Watson terá de trabalhar um pouco mais com o braço; A defesa da Crimson Tide é disparada uma das melhores do país contra o jogo terrestre, com 30 das 102 corridas de quarterbacks opostos sendo detidas antes da linha de scrimmage e apenas 2,3 jardas por carregada cedidas em média – assim, Watson deverá usar a corrida como uma constraint play, a jogada que faz a defesa pensar. Não só: screen, read option com Wayne Gallman e play actions deverão ser usados pelos Tigers para fazer a defesa de Alabama nunca saber o que esperar. Se ela souber e as chamadas de Clemson estiverem previsíveis e unidimensionais, a coisa complica para a equipe do técnico Dabo Swinney.
Pontualmente, o que Clemson precisa – e esta será a temática do texto para eventual vitória da Aliança Rebelde (não reclamem, sou nerd de Star Wars, o uniforme dos caras é laranja e Nick Saban é um Sith) é que a equipe tenha big plays. Se algumas das constraint plays (seja corrida de Watson, screen para Gallman ou um dos recebedores) der certo para mais de 25 jardas, a defesa de Alabama ficará atordoada. É isso que Dabo Swinney quer neste jogo.
Derrick Henry (RB, Alabama) vs. Front Seven, Clemson (DL, LBs)
Vencedor do Heisman Trophy (dado ao jogador mais extraordinário do College Football) e tendo atingido 2000 jardas terrestres na temporada após o Cotton Bowl (semifinal), Derrick Henry talvez enfrentará o mais decisivo dos duelos – e possivelmente o mais difícil da temporada – contra a defesa de Clemson. Mais do que uma unidade que cede poucas jardas totais por jogo pelo chão (e a gente sabe que esse dado não é tão confiável no contexto do College), a defesa de Clemson é eficiente contendo as corridas no backfield: 36% das corridas do adversário não tem ganho nenhum ou são paradas para perdas de jardas.
Por que isso é importante? Simples. Jake Coker (quarterback, Alabama) está longe de ser um dos melhores signal callers do país. Com corridas de Henry detidas para nenhum ganho ou perdas de jardas, isso pode significar que Coker estará preso em situações de terceiras descidas longas. Nas últimas três partidas da temporada regular (contra FBS, Mississippi State, Florida e Auburn) foram apenas três passes de Coker para pelo menos 15 jardas. Aqui, os nomes que você tem que ficar de olho no lado de Clemson são de dois linebackers (Ben Boulware e B.J Goodson) e de um safety que pode operar de maneira bastante semelhante a Kam Chancellor ontem contra os Vikings – fazendo com que haja costumeiramente oito homens no box: Jayron Kearse.
Cam Robinson (LT, Alabama) vs. Shaq Lawson (DE, Clemson)
Substituto de Vic Beasley Jr no elenco de Clemson (Beasley foi para a NFL, lembrando), poucos esperariam que Shaq Lawson fosse um novo-rei tão eficiente (ou até mais) do que Beasley fora no ano passado. Lawson é fortíssimo candidato a ser escolha de primeira rodada no Draft – o grande problema é que ele se machucou na semifinal contra Oklahoma. Perguntado sobre sua condição de jogo, Shaq disse que está 80% pronto para a partida – e Dabo Swinney se mostrou otimista sobre o assunto em coletivas. Vejamos, porque Clemson precisa dele – sobretudo em situações óbvias de pass rush, como as terceiras descidas acima mencionadas. Lawson é o líder da FBS em tackles para perda de jarda (daí sua importância na contenção do jogo terrestre também) com 23,5 e tem 10,5 sacks neste ano.
Seus números nesta temporada podem não ser transcritos facilmente no campo do University of Phoenix Stadium para hoje. E não é nem pela lesão, mas porque ele enfrenta diretamente na linha ofensiva de Alabama um forte left tackle, Cam Robinson (segundanista, Freshman All-American na temporada de 2014 e All-SEC em 2015). Este, aliás, pode ser um dos principais (e dos mais subestimados, por envolver linha ofensiva) duelos desta partida.
O resultado deste duelo pode ter ramificações decisivas no jogo. Se Lawson vencer e fazer a vida de Jake Coker um inferno, o time de Alabama pode ficar unidimensional em seu playcalling – com mais corridas, dado que o jogo aéreo não tem tempo para funcionar. Estando unidimensional, a defesa de Clemson sabe o que esperar – e sabendo, pode conter Derrick Henry de maneira mais decisiva.
Outros duelos importantes (ataque vs defesa):
- Dominick Jackson (RT, Alabama) vs Kevin Dodd (DE, Clemson)
- Eric Mac Lain (OG, Clemson) vs Jarran Reed (DL, Alabama)
- Artavis Scott (WR, Clemson) vs Cyrus Jones (CB, Alabama)
Quando Clemson tiver a bola…
Dentre meus axiomas preferidos sobre o College Football, o “Nick Saban sofre contra spread offense” é top-5. Acredite: o sistema ofensivo de Clemson pode ser a ventoinha de exaustão da Estrela da Morte. O princípio é simples: se você espalha recebedores no campo (ou seja, a essência da spread), você consegue fazer com que o front seven esteja espalhado no campo. Por consequência, se você espalha o front seven, ele perde eficiência contra a corrida e no pass rush. Deu certo em duas ocasiões: Johnny Manziel e Texas A&M contra Alabama em 2012 e Auburn com seu kick six no final, no Iron Bowl de 2013.
Sabendo desse problema, a exemplo do Imperador Palpatine nos planos da Segunda Estrela da Morte, Nick Saban reforçou seu recrutamento na questão do pass rush. Se em momentos de blitz a equipe da Crimson Tide for eficiente, o negócio pende para Alabama. Neste sentido, o pass rush de Saban neste ano é mais eficiente do que nos outros – notoriamente com A’Shawn Robinson. Quando enfrentou quarterbacks móveis neste ano, o duelo pendeu para Alabama (Auburn, LSU e Mississippi State só para citar alguns exemplos) É por isso que quando Clemson estiver com a bola, tem de fazer de tudo para neutralizar a pressão de Alabama – assim, o confronto pende para a eficiência da spread contra Saban.
Como neutralizar?
Fazer o campo ficar o maior o possível para a mente dos jogadores defensivos. Lá em cima já demos a dica de como isso pode ser feito taticamente – as chamadas constraint plays que já falamos também; screen, play action, jet sweep e coisas que façam a defesa pensar. Mas, acima de tudo, Clemson precisa das big plays. Poucas coisas desmoralizam mais uma unidade defensiva do que ceder uma jogada de 20 jardas ou mais. Para vencer Alabama é necessário ter pelo menos 20 jogadas explosivas e não fazer besteira em nenhum outro lado da bola – daí, também, a necessidade de que Artavis Scott vença seu duelo contra Cyrus Jones no jogo aéreo. Ao mesmo tempo – sobretudo na red zone – o tight end Jordan Leggett tem que aparecer forte. Leggett é um dos líderes em eficiência do time na red zone muito devido aos seus dois metros de altura – considerando que passes para tight ends são ótimas válvulas de escape contra a pressão, ele tem de vir forte e mostrar suas credenciais. Ele não é o líder de touchdowns deste time (7) a toa.
Em todas as vezes que a Estrela da Morte rubra foi detonada, o foi porque o adversário usou e abusou de eficiência em big plays. Não há segredo, não vai ser fácil: mas se fôssemos escolher um quarterback para ser o Luke Skywalker e dar o tiro improvável, esse cara seria DeShaun Watson.
Veja também: A Estrada para Glendale – Como #1 Clemson chegou à final
Quando Alabama tiver a bola…
Na semifinal contra Michigan State vimos Jake Coker ter sua estrela brilhando muito mais do que a de Derrick Henry. Não se engane: dificilmente Lane Kiffin, coordenador ofensivo da Crimson Tide, deixará de chamar o máximo de corridas o possível – especialmente no início do jogo. Clemson quer um jogo com pontuação alta, com up-tempo; Alabama quer evitar isso. E como se evita? Correndo e gastando cronômetro.
A presença de Derrick Henry, taticamente falando, é essencial em vários pontos. Já mencionamos nos duelos alguns deles – como por exemplo a necessidade de forçar terceiras descidas curtas com suas corridas – mas existem outros pontos. Indiretamente, o sucesso de Henry pode ajudar a defesa de Alabama. Com ele correndo, o cronômetro continua correndo junto – e sabendo que o cronômetro é um recurso limitado em 60 minutos, quanto mais Alabama ficar em campo no ataque, menos a spread offense de Clemson estará (e menos cansada a defesa da Crimson Tide também estará).
Acima de tudo, Henry precisa desenvolver suas corridas para mais de 20 jardas. Também já mencionamos que a defesa de Clemson é oito ou oitenta – e isso deve estar sendo uma pulga atrás da orelha de Brent Venables, coordenador defensivo do campeão da ACC. São 22 corridas para mais de 20 jardas na temporada. Esse é o tipo de coisa (a exemplo do que Watson quer fazer com a defesa de Alabama, também) que destrói o espírito de um time. Não se esqueça do contexto: estamos falando de garotos de 20 e tantos anos, bastante inconstantes sob o aspecto emocional da coisa, e que estão no maior palco do esporte universitário. Mais do que físico, o jogo é mental também. Assim, Henry correndo é muito mais do que jardas totais e seus jogos para mais de 200 jardas: é controle do relógio, é controle do destino do jogo.
Veja também: A Estrada para Glendale – Como #2 Alabama chegou à final
Estatísticas que interessam
I) Defesa terrestre de Clemson é 8 ou 80: da mesma maneira que é a líder da FBS em corridas detidas no backfield (36%, já passamos esse dado acima), a equipe dos Tigers é a 83ª do país cedendo big plays. São 22 corridas para 20 jardas ou mais nesta temporada. Considerando que Derrick Henry recebe a maioria dos handoffs visando corridas para “fora” dos offensive tackles, isso pode ser um problema. A agressividade da defesa de Clemson é uma faca de dois gumes.
II) Alabama tem apenas 36% de aproveitamento em 3ª descida, é a 97ª pior (de 128) marca do país. E aí, o que vai acontecer se Henry for contido e Nick Saban ter que contar com o braço de Jake Coker? A tendência histórica é ruim; Mais: considerando que 3rd +5 seria uma situação de pass rush – e estamos falando do pass rush de Clemson, afinal – a coisa pode descambar ainda mais. É extremamente necessário que o time de Alabama se poste em terceiras descidas curtas.
III) Alabama cedeu seis corridas para mais de 20 jardas nesta temporada – apenas uma para quarterback. Porém, foram 39,3% de passes completados para mais de 20 jardas (57 do país). Ao mesmo tempo, DeShaun Watson tem 16 passes para touchdown em lançamentos para mais de 20 jardas. Em suma, se quiser dar seu tiro na Estrela da Morte usando a Força, Watson deverá fazê-lo com as mãos e não com as pernas.
Entenda por que a estatística “jardas totais” não significa absolutamente nada no college football
Previsão
É o confronto dos sonhos para o fã de College Football, dado que reúne as kriptonitas de Alabama (spread offense) e de Clemson (jogo terrestre, defesa terrestre e manejo do cronômetro). Fica bastante difícil prever este jogo e suas dinâmicas, dado que são muitas (tentamos elencar o máximo delas acima).
Em resumo, porém, deve ser exatamente como em Star Wars. Sabemos que a metáfora pode ser um pouco cansativa nesta altura do texto, mas ela sumariza exatamente o que esperar. Alabama tem defesas espalhadas por toda a Estrela da Morte – seja em front seven ou em secundária, esta um pouco menos eficiente que o pass rush. Clemson tem em média 5,2 jardas por carregada – precisa de pelo menos 8, ou de números semelhantes aos da partida contra Oklahoma, para ter uma chance.
Mais do que táticas ou qualquer outra coisa, às vezes temos que pensar em quesitos mais subjetivos e mais “de outro mundo” para deter uma potência como Alabama. É o time com as instalações atléticas mais sedutoras para jogadores recrutados, o time que constantemente produz talentos para a NFL, o time franco-favorito na conferência mais prestigiada no país e que ano após ano entra a temporada do College Football sendo favorito a pelo menos chegar na semifinal. Para destruir um império como este, só a Força de Luke Skywalker num tiro preciso. Só o atleticismo e a perícia de DeShaun Watson. Em 2012, Johnny Manziel foi o escolhido e anulou Nick Saban com corridas e passes em profundidade. Neste College Football Playoff National Championship, a saga de Watson também pode ser a que determinará o resultado da partida. Se ele jogar como Manziel e conseguir big plays, Clemson tem uma chance. Se não, a Marcha Imperial de Nick Saban continuará a ecoar.









