Uma das piores combinações que pode existir é mercado consumidor pequeno e diretoria disfuncional. Diretorias ruins em mercados grandes são mais pressionadas, tanto pela imprensa quanto pelos torcedores, e, comumente, não demoram muito para sair de cena. Já mercados pequenos podem sobreviver muito bem com diretorias competentes e que sabem explorar os recursos que as ligas oferecem para manter o equilíbrio.
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Quando a diretoria disfuncional encontra o mercado pequeno o problema fica mais complexo. A mídia, mais ocupada em destrinchar os times mais populares, acaba por não pressionar tanto e, consequentemente, adota uma postura de lembrar pouco daquele time – e quando lembra é para fazer tirar sarro. Já os torcedores acabam desanimando muito, pela falta de competitividade, e até mesmo fica muito difícil atrair novos free agents – afinal, quem quer jogar em um lugar pequeno e que a franquia não produz? O problema fica ainda pior quando não se consegue segurar os talentos dentro de casa – um sinal de que nada vai bem.
O Cleveland Browns chegou a esse último estágio. Desde declarações que a franquia parece a universidade, que depois de quatro anos se vai embora, até os resultados pífios dentro de campo. Fica visível que a diretoria e Jimmy Haslam (o dono) não conseguem sair do caos instaurado – muito por incompetência deles. O resultado não foi o pior elenco da liga, mas sim o mais underachieve e bagunçado possível de se imaginar. A solução da vez é a chegada de Hue Jackson, mas isso fará com que as coisas tornem-se melhores? Aliás, ele vai ter material humano para trabalhar?
O desastre nos Drafts e o time cheio de potencial desperdiçado
Para entender a situação dos Browns é preciso olhar para o Draft e o Eduardo fez um trabalho fantástico dissecando a zona realizada desde 2011. Em poucas palavras, a franquia cometeu erros atrás de erros, chegando ao ponto de ignorar opiniões (pagas) alheias para draftar Johnny Manziel e acabar com um bust histórico.
Só que boa parte destes erros não se devem ao fraco trabalho de scouts, mas sim ao desenvolvimento precário do elenco – motivado pela alta rotatividade das comissões técnicas e pelas escolhas pouco seletivas dos substitutos. Hue Jackson é o quinto treinador desde 2009, a maior rotatividade da liga. Sem estabilidade da comissão técnica, os jogadores acabavam não se desenvolvendo em um sistema só e toda hora tinham que recomeçar o trabalho. Esta bagunça afeta ainda mais o lado defensivo, visto que diferentes técnicos preferem diferentes sistemas e sempre há uma curva de aprendizado e adaptação passando de um estilo para o outro.
Com tantas mudanças, fica óbvio que Phil Taylor, Justin Gilbert e Barkevious Mingo foram atrasados ainda mais pelos seus coordenadores. Enquanto todos sabiam que Mingo iria sofrer para se adaptar quando foi draftado, Gilbert era tido por alguns como o maior talento na posição de cornerback daquele Draft (a não ser por nós, visto que considerávamos Kyle Fuller um melhor prospecto. Acabou que ninguém estourou como deveria) e também falhou – assim como Taylor. A grande realidade é que mudanças de sistemas afetam o desenvolvimento de qualquer talento defensivo e o imediatismo de Cleveland tem uma grande parcela de culpa no desenvolvimento tardio das peças draftadas.
Olhando mais profundamente no lado defensivo, é possível notar que ou a posição possui um monte de jogadores que estão devendo ou falta muita qualidade mesmo. O front seven tinha tudo para ser um dos mais underrateds da liga, porém os anos de mudança constante afetaram o desenvolvimento de todo setor. Agora com Ray Horton de volta, a esperança é que ele possa trabalhar bem uma linha defensiva extremamente jovem (seria interessante se ele pudesse extrair o máximo de Danny Shelton em um sistema 1-gap) e um corpo de linebackers jovem e com potencial – o talento está lá, só que falta desenvolver.
Com relação a especialidade de Horton, a secundária, Cleveland vai muito mal. Tirando a ilha Joe Haden (que foi para a PUP list, vale lembrar, o que deve lhe limitar ao longo do ano), a incerteza domina. A coleção de safeties disponíveis (que inclui Rahim Moore como o líder) tem tudo para ser… uma das piores da AFC. Já a posição de cornerback é cheia de potencial, mas pouco produtiva em campo – e com um Tramon Williams que está longe do auge de sua forma.
Mas o que importa seria o ataque?
Uma defesa com potencial e pouco desenvolvida poderia ser ajudada por um ataque que realmente funciona. Faz muito tempo que a cidade não vê uma ofensiva que encante e para isso acontecer será preciso que Robert Griffin III, recém nomeado o titular do ano, dê a volta por cima na carreira. O mais importante é que a comissão técnica ao seu redor tem muito potencial, liderada pelo técnico principal Hue Jackson, mas isto depende muito mais dele.
Muitos comparam a possibilidade de volta por cima dele com a de Michael Vick. A comparação deveria terminar nos dois obtendo certo sucesso nos Playoffs e serem jogadores atléticos. Quando Vick foi para a cadeia, e viu o seu mundo desmoronar, ele chegou ao fundo do poço e teve que realmente dar uma volta por cima. Perdeu seu contrato com Atlanta, voltou para a liga super desconfiado e como terceira opção no Philadelphia Eagles. Ganhou o vestiário, galgou seu lugar a titularidade e conseguiu terminar a carreira sendo respeitado pelos companheiros e jogando em um nível aceitável.
Compare esta trajetória com Griffin: quando machucou o joelho, ele estava mais preocupado com suas propagandas para a Nike do que com a recuperação. Griffin e Russell Wilson dominaram em 2012 com o Read Option, porém este construiu a sua qualidade no passe a partir do sucesso inicial – e por isso hoje é um dos melhores da liga. Já Griffin parou no tempo e nunca conseguiu se desenvolver como grande passador. O problema é que o banco enfrentado em Washington poderia ser encarado como um resultado de uma franquia disfuncional, e não um fundo do poço para tirar proveito e aprender para o futuro. Como em Cleveland o trabalho para virar titular novamente foi mínimo, fica difícil acreditar que ele teve o choque de realidade que tanto precisava. Aliás, vale ressaltar que o casamento Browns e Griffin é perfeito: as duas partes sofrem do mesmo mal. Em Cleveland, vale lembrar, Griffin vai ter a disposição tanto playmakers quanto uma linha ofensiva extremamente jovem.
Enquanto o lado esquerdo da linha (a dupla Joe Thomas, um dos melhores tackles na AFC, e Joel Bitonio) não comprometeram no ano passado, o resto é um ponto de interrogação. Cameron Erving ficou preso atrás de Alex Mack (e quando entrou em campo, fora de posição, oscilou muito) e o lado direito é uma verdadeira bagunça – vai ser um problema durante o ano inteiro. Ou Robert Griffin muda seu estilo e começa a soltar a bola mais rapidamente, ou ele não jogará os 16 jogos.
Com relação aos playmakers, a pior posição de longe (também é a mais carente de todo o elenco) é a de tight end. No backfield, a expectativa é que a dupla Duke Johnson e Isaiah Crowell continuem o bom trabalho de complemento que fizeram no ano passado. Vale lembrar que a franquia foi sólida ano passado correndo com a bola (ficou na média com 4.0 jardas por corrida) e agora deveria ocorrer um salto de produtividade. Por fim, na posição de recebedores existe uma salada de nomes (incentivado pela escolha de cinco wide receivers no Draft) e pouca produção no nível profissional – apenas Andrew Hawkins tem alguma produção na carreira.
O problema não é falta de talento; é falta de desenvolvimento dos talentos
Todas estas palavras servem para confirmar o óbvio: o problema dos Browns está nos treinamentos, na falta de continuidade, no imediatismo e na falta de planejamento. Os erros no Draft são amplificados pelo fraco desenvolvimento dos talentos, motivado por um carrossel de técnicos que passou por ela – consequência direta do trabalho de Jimmy Haslam.
Apesar desta disfuncionalidade, a franquia ainda pode dar a volta por cima em pouco tempo. Este elenco possui mais potencial que o de San Francisco, por exemplo, e pode dar um salto de qualidade se Hue Jackson e Robert Griffin III realmente fizerem um trabalho bem feito.
Só que a expectativa não é muito alta. Sinceramente não há qualquer amostra que Griffin aprendeu com os erros e vai evoluir como passador, líder e jogador – além de que vai melhorar a sua ética trabalhista. Se ele voltar à forma apresentada em Washington (tirando o ano de calouro), os Browns vão ser sérios candidatos a disputar a first overall pick no ano que vem. Este não é o pior elenco da liga, mas é de longe o mais underachieve e o que mais tem potencial para acabar com a melhor escolha no ano que vem.
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