Imagine que você possua uma Ferrari; daquelas vermelhas, com um ronco do motor que faz seu corpo arrepiar. Ela te fez feliz por anos, até que, um dia, começou a apresentar defeitos e você pensou que o problema tinha relação com seu mecânico de confiança. Com isso, você levou sua Ferrari em outro mecânico da cidade – inexperiente, mas com a promessa de ser um novo talento na indústria automotiva – e…, os problemas continuaram. Após mais um erro, então, você começa a se questionar se o tempo de vida de sua Ferrari chegou ao fim ou se ambos os mecânicos não foram capazes de solucionar os problemas.
Creio que você já se situou aonde desejo chegar – e que a Ferrari vermelha, na verdade, é verde. Após a trágica derrota contra o San Francisco 49ers, no último Sunday Night, a luz amarela das atuações de Aaron Rodgers se acendeu mais uma vez. A sintonia do quarterback com o esquema de Matt LaFleur é muito oscilante e, portanto, é impossível saber qual versão de Rodgers entrará em campo: a do último domingo ou a que foi vista em outubro, nos confrontos contra Raiders e Chiefs. Com a alvorada dos playoffs já presente no horizonte, é necessário que tanto Rodgers quanto LaFleur entendam o que vem levando à queda de nível do quarterback, pois, ainda que a vaga do Green Bay Packers na pós-temporada esteja pouco ameaçada, o sonho da busca pelo título pode ser encerrado em decorrência dos problemas apresentados por aquele que sempre carregou o ataque nas costas.
O problema fora de campo: Matt LaFleur
Não gosto de diminuir os problemas de um quarterback devido às questionáveis chamadas de seu treinador, mas as dificuldades de LaFleur em fazer o ataque girar são tão óbvias que se torna impossível não o mencionar como responsável pela queda de nível de Rodgers. Na partida contra os 49ers, por exemplo, o técnico viu seu jogo corrido ser neutralizado completamente desde o início do confronto pela linha defensiva de San Francisco e foi incapaz de fornecer uma resposta. Esse é um processo, aliás, que foi observado durante todas as derrotas dos Packers em 2019: Aaron Jones foi mal utilizado no jogo terrestre, as corridas não engrenaram e, consequentemente, as chamadas aéreas de LaFleur começaram a pifar.
Rodgers tem culpa no cartório por não participar ativamente de um processo de reformulação das chamadas ofensivas, mas o sistema de LaFleur é incapaz de ser uma ameaça se algo não sai como o planejado. Com um ataque que insiste em não engrenar, o nível do quarterback é declinado automaticamente, pois o play-action deixa de ser funcional e a falta de qualidade no corpo de recebedores – com exceção de Davante Adams, obviamente – pesa, ainda mais quando as chamadas ofensivas não criam janelas para os recebedores.
Essa última parte parece estranha? Compare o sistema de LaFleur com o de Kyle Shanahan. O corpo de recebedores dos 49ers também não é recheado de talento, mas Shanahan entende esse fato e volta o seu sistema ofensivo à rotas que criem grandes janelas nos buracos defensivos e que facilitam a vida de seus recebedores, além de maximizar as habilidades de Jimmy Garoppolo.
Nesse ponto, há solução? Sim – e ela deve partir por parte do técnico e do quarterback. Aaron Jones deve ser mais envolvido no jogo terrestre e aéreo e as chamadas precisam ser reativas ao que a defesa adversária lhe oferece, facilitando a vida do corpo de recebedores e, principalmente de Rodgers, o qual precisa participar ativamente dessa reformulação. O problema, contudo, não está só no treinador e, com isso, chegamos ao próximo ponto.
Como Rodgers esbarra em si próprio
Ok, a priori parecerá estranho o que direi a seguir, mas um fator determinante na queda de nível de Aaron Rodgers se deve ao quarterback esbarrar em si mesmo constantemente. Como assim? Se observarmos apenas as estatísticas de Aaron Rodgers em 2019, aparentemente, analisaremos um ano medíocre em sua carreira, o que não nos deixaria preocupados à primeira vista, afinal o problema não estaria nele. Há, todavia, dois elementos que mantém Rodgers preso em suas próprias amarras e que, consequentemente, limitam a produção ofensiva da franquia e mantém a queda de nível do quarterback.
O primeiro desses elementos é técnico. Se LaFleur possui culpa por não facilitar a vida de seus recebedores, Rodgers possui culpa por não os maximizar. O quarterback sempre está à procura de Davante Adams – o wide receiver é alvo de, aproximadamente, 1/3 das tentativas de passe de Rodgers desde a semana 9 – por ser seu único homem de confiança, ignorando o restante do corpo de recebedores. Curiosamente, nas quatro semanas em que Adams esteve fora, Rodgers distribuiu melhor a bola e os Packers venceram todos os jogos. A culpa aqui não é do técnico, mas do próprio quarterback, o qual possui intensa dificuldade de transmitir confiança ao seu ataque – e, com isso, chegamos ao segundo elemento.
O outro ponto principal parte da pessoa em si. Rodgers não está se mostrando capaz de ser um líder dentro de campo. Em outra comparação com San Francisco, Garoppolo compensa suas escorregadas técnicas com uma liderança que é demonstrada por seus companheiros. Os problemas de personalidade de Rodgers, por outro lado, são temas de discussão há algum tempo e explodiram na última intertemporada após revelações de distúrbios que ocorreram na época em que os Packers ainda eram comandados por Mike McCarthy. Quando as coisas não ocorrem como o esperado, o ataque sempre se volta ao seu quarterback, o qual precisa assumir uma postura de líder. Está na hora de Rodgers mudar sua imagem, antes que seja tarde demais.
O quarterback possui a maior parcela de culpa pelos sua própria queda de nível e não há motivos para encontrar outros problemas ou diminuir a intensidade das críticas nesse ponto. Por mais que seja um dos grandes da história, Rodgers está esbarrando em si mesmo e se deixando derrotar pelas suas próprias falhas, atrapalhando o destino e as ambições da temporada de Green Bay. Se o outrora MVP não dar um passo atrás e rever suas atitudes em campo, assumindo uma postura de líder, o sonho do Super Bowl instaurado no início de 2019 não será alcançado e seu declínio pode começar a ser permanente







