É intrigante como o esporte, uma esfera com tantas minúcias, consegue nos levar para a superficialidade. Seres humanos se tornam bonecos, bonecos se tornam números, números ficam sem contexto. Parece papo de crítica social, mas é apenas um reflexo da realidade. Vemos vitórias e derrotas, enquanto as narrativas ficam para trás.
No Draft – momento polarizante, no qual não pode haver erros – isso torna-se ainda mais inflamado. De que serve, por exemplo, selecionar um quarterback que teve números espetaculares na universidade, mas que há muitas dúvidas no tocante a seu salto para o nível profissional? Será que é tudo tão simples assim?
Essa situação se repete todos os anos. Em 2023, Hendon Hooker é a bola (ou o quarterback) da vez. Estrela em Tennessee, o passador é o protótipo que nos acostumamos a ver: tem os atributos físicos para ser um bom jogador, mas falta refino – bastante. No entanto, a análise não pode se limitar a isso. Acabamos de falar que costumamos resumir demais os esportes, quando a realidade é muito mais complexa. O que está por trás de uma promessa como Hooker, tratado, simplesmente, como um “patinho feio”?
A benção e a maldição
Ser um quarterback amado na universidade é uma experiência fascinante. O amor da torcida, a emoção dos jogos – é como ser o astro da base de um time de futebol grande no Brasil, mas com proporções ainda maiores. Imagine ser tratado como ídolo em uma faculdade que revelou Peyton Manning à liga? Uma experiência indescritível.
E não sou que estou dizendo isso, mas a própria universidade de Tennessee. Descrito como “um quarterback que revolucionou o programa e o levou de volta à relevância nacional, [Hooker] deixou sua marca como um dos mais adorados e respeitados jogadores da história da universidade”. Além disso, seu ano de 2022 foi considerado “discutivelmente, o melhor da história da faculdade”.[foot]A fonte das frases vem da própria universidade via UT Sports.[/foot] Elogios de sobra.
O que passa na cabeça de um jovem como esse, então, quando ele se declara para o Draft e começa a ser especulado como uma escolha de terceiro dia – com muita sorte, de segundo? É isso que falta na análise dos esportes. Hooker, que apresentou números espetaculares na universidade pela qual passou Payton Manning, que é considerado exemplo dentro e fora de campo e que tem ótimo biotipo físico, chega no momento mais importante de sua carreira e…, falha (?).
Nós não conseguimos mensurar isso. É a benção e a maldição de sonhar em ser um quarterback. A felicidade do estrelato na universidade e a dificuldade de conseguir uma vaga de titular na NFL. Mas, é um sonho impossível para quem trabalha arduamente?
O potencial a ser explorado
Não, não é um sonho impossível. Quando se sabe que há o potencial e seu histórico é de trabalho intenso, as portas se abrem. O foco de Hooker, agora, não pode estar no ponto de sua seleção; seja na primeira ou na última rodada do recrutamento, o vital é agarrar a oportunidade.
Pensando em seu potencial, Hendon já possui consigo as características que são as mais difíceis de serem alteradas: precisão/força no braço, capacidade atlética – tem bons atributos físicos e é ótimo saindo do pocket para ganhar jardas com as pernas – e mentalidade vencedora. Quando Tennessee precisou dele, ele cresceu.
Isso não quer dizer que ele pode ser o titular desde a semana 1; Hooker precisa se adaptar a um nível mais rápido de jogo, já que o sistema ofensivo da universidade era bem simples, e sofrer com as dores de não ter janelas abertas de passe e proteções limpas. Refinando sua mecânica e se adaptando ao nível de jogo, seu potencial é ótimo.
Obviamente, o lugar que o selecionará impactará diretamente na sua evolução como passador na liga. O que importa para Hooker é utilizar seu lado mental para se provar a cada dia. Entenda que todos não o consideram uma unanimidade – não é preciso mudar a mentalidade do mundo – e trabalhe arduamente para que seu destino seja alterado. Capacidade para isso, ele possui, agora chegou o momento de provar que tanta idolatria na faculdade não foi exacerbada.
Sair de momentos de glória para ter de se provar mais uma vez exige muita força mental. Para um homem que diz ter seu “pai como grande ídolo, pois lhe ensinou o valor do trabalho duro”, isso não deve ser um grande obstáculo. O patinho feio, virará um cisne no final? Está aí uma das boas histórias que o esporte nos proporcionará, outra vez. É por isso ser tão importante deixarmos a superficialidade.
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