O HOMEM POR TRÁS DO SUCESSO DE LAMAR JACKSON

Como coordenador ofensivo, Greg Roman tem um longo histórico de sucesso trabalhando com quarterbacks móveis e ataques terrestres poderosos. Lamar Jackson é apenas mais exemplo de uma história que começou com Colin Kaepernick e Tyrod Taylor

Poucos coordenadores ofensivos foram tão bem-sucedidos na última década quanto Greg Roman. Ele não é nenhum “encantador de quarterbacks”, título concedido, por exemplo, a Bruce Arians, mas ajudou vários signal callers a atingirem o ápice de suas carreiras. Ele também não é considerado uma mente revolucionária como Sean McVay ou Kyle Shanahan, mas seus ataques sempre são muito eficientes e têm uma identidade própria bastante definida, baseada em quarterbacks móveis e um jogo terrestre demolidor.

Quem lembra do trabalho de Roman no San Francisco 49ers e Buffalo Bills, respectivamente com Colin Kaepernick e Tyrod Taylor, certamente não está surpreso com o seu sucesso no Baltimore Ravens e com Lamar Jackson. É um casamento que sempre pareceu fadado a dar certo, desde quando o ex-assistente e técnico de tight ends foi promovido ao posto de coordenador ofensivo da franquia em janeiro.

Roman tinha tudo o que precisava para brilhar nos Ravens, incluindo o quarterback mais talentoso que já treinou, bons running backs, uma linha ofensiva consistente, tight ends que se sobressaem nos bloqueios e liberdade total para desenhar o ataque e chamar as jogadas. Não por acaso, Baltimore está no topo do ranking em várias estatísticas ofensivas, incluindo jardas terrestres (203) e pontos (34) por partida, e Lamar Jackson vem tendo uma temporada digna de MVP.

O atual sucesso, contudo, tem suas raízes no passado. Olhando para o trabalho de Roman nos 49ers e Bills, o primeiro há quase uma década, notaremos vários conceitos empregados hoje em dia pelos Ravens – como dissemos, sua identidade ofensiva é bastante definida.

Formação Pistol e read option, os alicerces de Roman desde San Francisco

Lembra quando a read option tomou a NFL de assalto em 2012 e chegou até a ser apontada como o futuro do esporte? Greg Roman foi um dos “culpados” por isso – na verdade, ele, Colin Kaepernick e o San Francisco 49ers, onde foi coordenador ofensivo entre 2011 e 2014. Estávamos no auge da era dos dual-threat quarterbacks, ou seja, signal callers perigosos tanto lançando quanto correndo com a bola, simbolizada pela ascensão de Kaepernick, Robert Griffin III e Russell Wilson.

Para simplificar, a read option consiste, basicamente, em o quarterback receber o snap e ler a movimentação da defesa, optando por ele mesmo correr ou entregar a bola ao running back. Roman não foi o inventor da tática, haja vista ela ser absurdamente popular no College Football, mas foi quem mais teve sucesso a adaptando ao futebol americano profissional naquela época. Kaepernick e o ataque terrestre de San Francisco 49ers foram quase imparáveis por umas duas temporadas, até os coordenadores defensivos conseguirem desenvolver alguns antídotos.

Outro recurso bastante explorado e popularizado por Roman foi a chamada Pistol Formation, uma formação que casa perfeitamente com a read option. Nela, o quarterback fica algumas jardas atrás da linha ofensiva com o running back alinhado logo atrás dele – e não ao seu lado, como ocorre na formação shotgun. Isso permite uma flexibilidade de chamadas imensa, desde corridas com o running back ou quarterback, até play actions ou chamadas normais de passes. É uma formação tão versátil que chegou até a ser incorporada por Gary Kubiak no Denver Broncos e utilizada por Peyton Manning, mesmo que não houvesse a ameaça dele correr com a bola.

Enfim, a read option e a pistol eram a base do ataque dos 49ers em 2012 – Kaepernick, por sinal, já tinha familiaridade com a formação desde os anos na Universidade de Nevada -, assim como são a base do Baltimore Ravens de 2019. O site The Ringer publicou um texto excelente e cheio de gifs mostrando como Baltimore, há algumas semanas, castigou a poderosa defesa do New England Patriots combinando os dois recursos. Bill Belichick não tinha resposta para os avanços terrestres, ora pelo meio com Mark Ingram, ora pelas laterais com Lamar.

Contudo, embora os Ravens prefiram a formação pistol, é importante dizer que Roman tem um arsenal muito maior para ferir as defesas adversárias. Ele é um mestre em correr com a bola em diferentes formações, grupos de jogadores e estratégias, além de frequentemente utilizar movimentações pré-snap para confundir as defesas.

O famoso “Pacote Heisman”, utilizado contra o Cincinnati Bengals, é um exemplo de inventividade. Naquela jogada, Jackson fez a primeira leitura com Mark Ingram, que seguiu pelo meio da linha ofensiva. O quarterback não entregou a bola e correu pela lateral, porém, ao notar a aproximação de outro defensor, fez um pitch para Robert Griffin III, que conseguiu ganhar umas 10 jardas a mais até sair do campo. Os dois running backs alinhados no backfield – apesar de RGIII ser quarterback de ofício –, em uma formação usada pelo Oakland Raiders na década de 1960 e à época batizada como “Running Gun”, possibilitou a execução de uma bela triple option. Sério, não tem como ser mais criativo do que isso para correr com a bola.

Foco no ataque terrestre, mas nunca negligenciando os passes

O grande pulo do gato de Roman em comparação a outros técnicos com orientação terrestre é ele, apesar de tudo, nunca esquecer do jogo aéreo. Seus quarterbacks são sempre letais lançando em profundidade, mesmo que eles não sejam os melhores passadores do mundo.

Em 2015, o Buffalo Bills era um time essencialmente com vocação terrestre, confiando nas pernas de LeSean McCoy. Mesmo assim, acredite se quiser, Tyrod Taylor liderou a NFL com 16 passes para touchdown para mais de 20 jardas, quatro a mais do que Russell Wilson. Ademais, Taylor foi o 3º signal caller mais prolífico da liga no quesito “air yards”, ou seja, a distância em que a bola viaja da linha de scrimmage até o ponto onde é agarrada.

Naquele ano, os Bills doutrinaram nos passes longos e Greg Roman era o coordenador ofensivo do time. Isso foi possível graças aos play actions, os quais, segundo o site Football Outsiders, foram os mais eficientes da temporada. Era uma coisa muito manjada: o quarterback recebia o snap, ameaça entregar a bola para McCoy e lançava uma bomba de 40 ou 50 jardas para Sammy Watkins. Ainda assim, as defesas não conseguiam parar, tanto que Tyrod Taylor acabou eleito ao Pro Bowl.

Em San Francisco foi basicamente igual. Entre 2011 e 2013, os 49ers terminaram respectivamente com o 5º, 2º e 3º play action mais eficiente da liga, além de ver Kaepernick brilhar também no quesito air yards – logo ele, que nunca esteve perto de ser um passador refinado tecnicamente.

Roman castiga as defesas adversárias correndo com a bola até encontrar uma brecha para aniquilá-las com um passe profundo. É uma filosofia de futebol americano bem old school. Deu certo com Kaepernick e Taylor, então é óbvio que daria certo com Lamar Jackson, um passador muito mais talentoso.

Lamar possui a 7ª melhor média de air yards por passe completado (6,6) da liga, mostrando que seus lançamentos costumam viajar bem pelo ar – as conexões longas com Marquise Brown e Mark Andrews, por exemplo, já fizeram estrago e ajudaram Jackson a terminar com um rating perfeito duas vezes em 2019.

Roman é um dos coordenadores ofensivos mais subestimados da década

Acho que deixamos claro como Greg Roman é um personagem subestimado na história recente da NFL, além de ser um dos principais responsáveis pelo sucesso de Baltimore e Lamar Jackson. Por que ele não recebe mais amor entre os especialistas e fãs? Difícil dizer, apesar da sua estrondosa eficiência trabalhando com quarterbacks medianos como Colin Kaepernick e Tyrod Taylor.

De toda forma, mais do que eficiência ofensiva, o grande legado de Roman é ser um pioneiro na era dos quarterbacks móveis, um gênio do ataque terrestre que criou e consolidou uma identidade própria nos times onde passou. Além disso, quem sabe, ele talvez entre para a história como o técnico que lapidou e desenvolveu Lamar Jackson. Não é pouca coisa.

“odds