“Essa é minha opinião pessoal. Se me perguntarem, invistam em caras que tocam na bola, caras que podem marcar touchdowns, e aí vai ter um range de caras de segunda, terceira, quarta, quinta rodada até, que vamos encontrar jogadores titulares para a linha ofensiva.” A declaração em questão causou um certo furor num momento em que, vamos admitir, absolutamente nada de bom ou importante estava acontecendo.
A declaração em questão veio de Chris Foerster. Se você não o reconhece de nome, não se preocupe. Ele é o treinador de linha ofensiva do San Francisco 49ers desde a temporada de 2021, além de acumular outras funções, como coordenador do jogo terrestre (2022-24) e assistente do head coach (2025). Foerster é parte importante da comissão técnica de Kyle Shanahan e deu essa declaração ao final de maio de 2024, uma época onde os 49ers enfrentavam críticas por não terem adereçado a linha ofensiva de forma satisfatória no Draft que havia acabado de passar.
Passada a estreia da temporada 2025, um jogo onde Brock Purdy enfrentou os maiores índices de pressão (57,9%, Next Gen Stats) de sua carreira e cometeu erros por conta disso, a filosofia do time novamente volta a pauta. Num período onde os skills players são mais questionados, o grupo ainda contava com uma superestrela em Trent Williams protegendo o lado esquerdo. Só que Williams tem 37 anos e teve um jogo horrendo contra o Seattle Seahawks na Semana 1, resultando em uma tarde complicadíssima para Purdy.
A linha ofensiva dos 49ers é ruim, mas não deixa de ser reflexo de algo que a própria franquia negligenciou.
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A base ofensiva do ataque de Kyle Shanahan é algo que até o fã mais desligado de NFL já ouviu falar. Claro que existiram evoluções dentro do que ele apresenta, porque ficar estático na NFL é suicídio, porém os princípios que o treinador dos 49ers utiliza são praticamente os mesmos: outside zone, under center, play-action, muita motion pré-snap, blá blá blá.
Isso é algo que, mesmo em tempos de vacas mais magras, norteou a montagem de elenco de Shanahan e Lynch. Na primeira temporada da dupla, ainda em 2017 (e com uma liga ainda com muita dificuldade para parar seu sistema ofensivo), o time investiu em nomes como Pierre Garçon já acima dos 30 anos e em Marquise Goodwin como uma suposta arma ofensiva. Acabou que deu certo, muito por conta do treinador.
Só que a expectativa natural de sucesso total dos 49ers não se confirmou até hoje. Não foram poucas as boas temporadas da franquia e as chances de título, no entanto, especialmente nessa década, as temporadas de San Francisco acabaram justamente por problemas na pressão ao quarterback. É por isso que, nos últimos anos, o Pro Football gritou para que os 49ers pudessem reforçar as outras posições da linha ofensiva não-habitadas por Trent Williams, e infelizmente, não tem dado certo.
Ninguém nunca precisou de ajuda pra decifrar a qualidade dos skill players de San Francisco. Casando com um arquiteto ofensivo insano com o Shanahan, que estressava as defesas de todas as formas possíveis e dava todas as oportunidades horizontais do mundo, jogadores como Deebo Samuel, Brandon Aiyuk, George Kittle e Christian McCaffrey brilharam nesse ataque. Num sistema de passes rápidos e leituras fáceis, Shanahan era o responsável por chamar jogadas e explorar matchups específicos que tornavam o ataque dos 49ers um inferno de defender. Um pouco menos de air yards, muito mais de jardas após a recepção. Jogadores extremamente livres. Leituras fáceis, big plays, touchdowns.
Só que isso deixou de ser algo tão fácil nos últimos anos. A grande alteração defensiva que a NFL enfrentou nas temporadas recentes foi uma porcentagem muito maior de utilização de dois safeties no fundo do campo, diferente de, por exemplo, como o Jacksonville Jaguars de Todd Wash era baseado na cover-3 no texto linkado acima (leiam, é muito bom). O que Shanahan faz melhor que todo mundo é combinar seus conceitos de motion e outside zone para desafiar a defesa de várias formas mesmo com esse balanço mudando desde o início da década. É a mágica do play call.
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“Ok, mas o que isso tem a ver com a pergunta do início do texto?” Bom, assim como seu pai, Shanahan se baseia num sistema ofensivo específico e, por isso, busca jogadores com características específicas para executar tal sistema da melhor forma possível. Com tudo que ele é capaz de fazer com seus skill players, o que ele precisa, na prática, é que a linha ofensiva faça seu trabalho por menos tempo que o normal. Isso explica em partes a falta de investimento maciço nos protetores ao longo de seu período na franquia.
Desde o Draft de 2017, apenas Mike McGlinchey, Aaron Banks e Dominick Puni foram escolhas de, pelo menos, segundo dia para a franquia. Dois deles já nem fazem parte do elenco. A ideia geral é manufaturar os jogadores da linha ofensiva para executar o esquema, ter um protetor de alta qualidade no lado cego (Staley/Williams) e o resto… bem, joga pra Deus. Que não parece estar muito satisfeito com a construção de elenco dos 49ers nesse sentido.
Assim, a coisa mais inteligente a ser feita era justamente perguntar para alguém que acompanha a franquia diariamente. Pedro Narduchi, torcedor do time e parte do Endzone Brasil, basicamente confirmou a tese. “Shanahan parte de uma filosofia onde acredita que precisa valorizar mais os jogadores que são ativos no ataque. Os skill players tocam na bola; agora que os 49ers estão enfrentando mais marcações mano-a-mano, sem gerar muita separação, as oportunidades são poucas. Isso acaba sendo prejudicial, e eu não gosto. Eu acredito que você precisa de uma linha ofensiva e um bom quarterback e se constrói a partir disso. Mas Shanahan não acredita nessa hierarquia”, conta.
Os jogadores da linha ofensiva dos 49ers, falando da forma mais honesta possível, são ruins. Você não vai conseguir me convencer que Colton McKivitz, Ben Bartch e Jake Brendel estão pelo menos entre os 50% melhores de suas posições na liga (Dominick Puni teve um jogo ruim contra os Seahawks também, mas ele tem salvação). O problema é que nada disso chega a ser novidade; agora, no entanto, os 49ers estão enfrentando crises com relação aos seus skill players, especialmente por conta de lesões e falta de ritmo. Aquele tempinho extra para Brock Purdy executar o ataque? Pode esquecer. Trent Williams, a superestrela da linha, sempre fazia um trabalho de alto nível tanto no jogo terrestre quanto na proteção para o jogo aéreo. Só que a exibição contra Seattle foi tenebrosa e não pode se repetir.
Dá pra dizer que a linha ofensiva dos 49ers é abaixo da média por escolha? Não é nenhum absurdo afirmar isso quando se pensa em construção de elenco e no que a franquia fez em anos recentes. Não investir num center na free agency, como Shanahan fez com Alex Mack no início da década, incomodou Pedro. “Não ter ido atrás do Drew Dalman me deixou irritado, assim como a falta de um swing tackle. Os 49ers não possuem um plano B em várias posições”, conta. O que fica ainda mais preocupante quando se vê o quanto o plano A já é ruim.
O torcedor de San Francisco pode ficar chateado e espernear por melhoras, mas por ser um método de construção de elenco e filosofia geral do time, dificilmente vai mudar. Num mundo ideal, o ataque funciona muito bem a ponto da linha não ser um problema como foi em casos contra Los Angeles Rams, Philadelphia Eagles e Kansas City Chiefs.
Porém, como diz o famoso ditado, a definição de insanidade é fazer as mesmas coisas e esperar resultados diferentes. E são vários os exemplos que mostram um resultado negativo.
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