Não dá para dizer que é uma surpresa, mas também seria mentiroso dizer que não teve impacto: depois de 22 temporadas, Tom Brady está deixando a NFL. Prestes a completar 45 de idade, ele deve se dedicar a família, que já pedia há algum tempo para ele deixar os campos. Após sair do New England Patriots em 2020, Brady foi para o Tampa Bay Buccaneers, onde muitos – inclusive esse que aqui escreve – acreditavam que apenas cumpriria tabela. Ledo engano: novamente contrariando as perspectivas, o camisa 12 levantou um Super Bowl e confirmou seu status de vencedor.
Nunca torci para nenhuma equipe que Brady jogou, porém, como fã do Denver Broncos foram duas décadas o vendo construir uma dominância fora do natural na AFC. Por mais que meu time seja um dos de melhor retrospecto contra Tom – 9 vitórias e 9 derrotas na carreira -, não foram poucas às vezes em que ele machucou meu coração de torcedor. Todavia, ele também trouxe lições valiosas, como entender que para se ter sucesso num campo de futebol americano, talento não basta: sem se buscar a excelência, em algum momento você ficará pelo caminho.
Sempre sou um analista mais contido na parte emocional dos meus textos, voltados mais para parte técnica e tática do jogo. Temos no site pessoas melhores que eu em colocar sentimentos nas palavras: Curti, Eduardo, Bulio…todos eles têm essa veia melhor que a minha. Todavia, hoje vou pedir licença aos meus colegas para contar duas histórias rápidas sobre como era enfrentar Thomas Edward Patrick Brady.
Fiquei com a multa do condomínio na mão
Era janeiro de 2012, fazia muito calor em Jaraguá do Sul/SC, onde moro. Uma semana antes, os Broncos bateram os Steelers, no jogo em que Tim Tebow lançou para Demaryius Thomas correr para end zone, numa narração antológica de Everaldo Marques. Era a passagem para a semifinal da AFC, depois de 6 anos. Gritei como um louco no prédio em que morava e tomei uma multa por isso, mas nem me importei. Na minha cabeça de torcedor, tudo podíamos depois daquele momento, os Broncos estavam vivos.
Apostei com um amigo torcedor do New England Patriots, Romenito, que Denver iria até Foxboro e venceria. Cada centavo daquela multa teria sido bem gasto, meu time estava no caminho. Lembrem-se, eu era apenas um torcedor, não tinha nada de analista: apenas estava seguindo meu coração. Pouco me importava se Tom Brady estava do outro lado, os azarões estavam prontos para fazer a festa. Mas aí o camisa 12 me trouxe a realidade de novo.
Não bastasse a defesa dos Patriots mostrar para Tebow que ele não era um quarterback de playoffs, Brady lançou 6 touchdowns: ao fim do primeiro tempo, o placar já era de 35 a 7 para New England. Nos últimos minutos da partida, ele ainda tirou onda, chutando um punt numa terceira descida. Sim, Brady chutou o punt. Tudo isso sem nem suar ou despentear o cabelo direito. E eu, como fiquei? Com uma multa na mão e devendo uma Coca.
Brady me fez passar mal, literalmente
Quando Peyton Manning assinou com Denver, minha esperança de ver novamente meu time levantando o troféu cresceu. Quis o destino que o tempo fosse passando, até que em 2015, com Manning já se arrastando por lesões, os Broncos tinham a última grande chance de conseguir um título naquele ciclo. A enorme barreira estava lá novamente, agora na final da AFC: jogando no Colorado, o adversário era novamente Brady e os Patriots.
Tudo corria bem – dentro do possível para um final de conferência: a defesa dos Broncos tinha parado uma quarta descida, faltavam pouco mais de 2 minutos e a vantagem era de 8 pontos. Olhando hoje, fico pensando como pude ser tão tolo em acreditar que naquele momento a vitória estava sacramentada. Os Patriots tiveram a bola logo depois e já na primeira sequência, uma quarta para 10: Brady não só conectou com Rob Gronkowski, como ainda conseguiu o ganho de 40 jardas. Meu coração batia no ritmo do Olodum.
Nova quarta descida, agora na linha de 4 jardas. A pressão chegou, DeMarcus Ware na cara de Tom e….touchdown Patriots. Incrível, caí de joelhos no meio da sala de TV, repetindo em alto volume: não pode ser. Faltava a famigerada conversão de 2 pontos e eu suava sem parar. Dessa vez a bola foi desviada por Aqib Talib e Bradley Roby interceptou, garantindo a vaga no Super Bowl. Sai correndo pela casa, até que meu estômago deu o alerta: Tom Brady me fez cair de joelhos e vomitar de nervoso.
Contra o maior de todos os tempos, as emoções sempre estavam a flor da pele. Impossível pensar que eu teria sido tão fã de futebol americano se meu time não tivesse um antagonista como Brady. Tal qual Darth Vader, ele era aquele vilão que você queria ver derrotado, mas que nunca deixou de admirar e respeitar. Descanse Tom e muito obrigado: sem você esse jogo não teria a mesma graça que teve nos últimos 22 anos.
Para saber mais:
Crônica, Curti: Obrigado, Tom.
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