Não vamos esconder de ninguém que a NFL é uma enorme indústria e que algumas coisas são administradas como um banco. O time menos valioso da liga ainda tem valor de mercado na casa de um bilhão de dólares. Claro: há decisões estúpidas – mas na maior parte dos casos, o dinheiro vence a lealdade. Nada pessoal.

O fato de Cairo Santos ser brasileiro faz com que tenhamos, por óbvio, que destacar que o Kansas City Chiefs foi pragmático, frio e calculista. O que aconteceu com Cairo neste sábado acontece com vários jogadores ao longo de suas carreiras: são negócios.
A título de comparação, para cada Tom Brady com 18 anos de carreira você tem do outro lado,um running back que fica apenas dois anos na liga. Para ilustrar melhor: a carreira-média de um jogador é de 3,3 anos [note] a fonte é o site Statista[/note]. Não por acaso, é a duração média (4 anos) dos contratos de calouros de acordo com o último CBA[note]o acordo coletivo-trabalhista entre a Associação de Jogadores da NFL e a liga como um todo (os donos de franquias)[/note]. Para os kickers, a média de carreira é de 4,8 anos. Cairo está em seu quarto ano.
A carreira curta da maioria dos atletas é explicada na medida em que o jogo é cada vez mais atlético e se, machucados, os jogadores são cortados sem dó. Isso acontece a todo momento. No caso do Kansas City Chiefs, porém, a decisão era mais do que esperada. Mas não agora em 2017.
Nosso podcast sobre o assunto:
Teto Salarial é problema faz tempo
Já não é de hoje que o Kansas City Chiefs têm problemas com o teto salarial. Aos mais novos na NFL, as franquias podem gastar no máximo 169 milhões de dólares com o contrato dos 53 jogadores de seu elenco – esses 169 milhões são o teto, que é determinado em função do lucro da liga.
Considerando 2018, os Chiefs são o segundo time com menos espaço na folha salarial. Cairo, que não foi draftado em 2014, teve um primeiro contrato de três anos – sendo agente livre restrito ao final deste primeiro contrato. Aí, assinou um contrato de um ano e 1,7 milhões. No ano que vem, seria agente livre irrestrito, podendo assinar com qualquer equipe.
Dificilmente os Chiefs renovariam com ele. Sendo veterano e com um certo currículo na liga, o salário-base de Cairo giraria em torno de 2 milhões de dólares. Considerando o todo da NFL, não estaria nem entre os 500 maiores salários – mas com a situação apertada dos Chiefs, compromete.
O fato de Cairo se machucar fez com que Kansas City simplesmente antecipasse o que já deveria fazer no ano que vem. Duvida? Aconteceu a mesma coisa em 2014. Cairo sofreu do mesmo mal que Ryan Succop.
Succop, já há algum tempo um dos melhores chutadores da liga, era titular do time com salário de veterano – 1,5 M em 2013, algo que adequado para o teto de 2017, seria na casa dos 2,5 milhões. Os Chiefs viram em Cairo Santos uma oportunidade de consistência e, principalmente, economia. Como ele não foi draftado em 2014, seu salário era bem menor do que o de Succop. Não deu outra: Cairo no elenco, Succop na rua.
Neste ano os Chiefs fizeram a mesma coisa. Com Cairo se machucando e sendo colocado na reserva dos machucados, Kansas City foi atrás de Harrison Butker, calouro cujo contrato neste ano é de apenas 400 mil dólares.
A “justificativa” da Reserva de Machucados
“Oficialmente”, de acordo com a nota publicada por Cairo Santos em seu Instagram, os Chiefs cortaram o jogador para que houvesse espaço na reserva dos machucados. Esta reserva (IR, sigla para injury reserve) permite que um time carregue jogadores machucados num “extra” sem afetar a quantidade de jogadores ativos no elenco. A partir de 2017, dois jogadores podem ir e voltar dessa IR, cujo tempo mínimo de permanência é de 8 semanas.
Neste momento, dois jogadores importantes estão na IR além de Cairo: Spencer Ware e Eric Berry. Os dois já estão fora da temporada e não voltam mais aos campos neste ano – ao contrário de Cairo, cujo tempo de recuperação estimado é de seis semanas. Ainda, há a percepção de que Dee Ford, outside linebacker do time, possa ser colocar na IR. Claro: há o risco de jogadores com histórico de lesão também acabem precisando da IR – notoriamente Justin Houston, embora este esteja saudável.
Seja como for, a desculpa é de que os Chiefs precisam de espaço na IR e Cairo é – apenas -um kicker. Ok, mas eles (ainda) não precisam desse espaço. Mesmo que Ford seja colocado na reserva dos machucados, o time ainda poderia trazê-lo de volta e sobraria outro spot. A justificativa de precaução – ainda mais sabendo que Berry e Ware já estão fora da temporada – não cola. Ainda não há essa necessidade imediata.
Concluindo: são negócios e os Chiefs sabem disso
Kansas City apenas antecipou o que já faria em março do ano que vem, ao não renovar com Cairo. Agora, o time aposta em um calouro para manter a competitividade que Cairo lhes trouxe. Desde 2014, Cairo tem 6 field goals marcados de 7 tentados em 4º período/prorrogação com os Chiefs até três pontos atrás no placar. Ou seja: ele foi decisivo em situações nas quais o time precisou dele para empatar ou vencer jogos no último período de jogo. No ano passado, não fosse seu poder de decisão, o time poderia ter contado com pelo menos duas vitórias a menos. Pergunte a qualquer torcedor de Washington, Cincinnati, Seattle e Arizona – eles vão confirmar o que eu estou falando no que tange a “kickers não decidindo partidas”.
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Quem não se lembra do chute da vitória no Sunday Night Football contra os Broncos em 2016, por exemplo? Ou de seu primeiro chute para vencer o jogo, em San Diego contra os Chargers em 2014? Não, não estamos sendo ufanistas. Cairo não era um dos três melhores kickers da NFL – mas era consistente o suficiente para que o time não lhe “trocasse” por um calouro. A meu ver, o risco é alto nessa “troca” – até considerando o currículo de Cairo e agora haver um calouro em seu lugar. Como Younghoe Koo provou nos Chargers neste ano, calouros fazem calourices, não? Acho que, mesmo a NFL sendo um enorme negócio, os Chiefs foram longe demais na frieza. O tiro pode sair pela culatra.
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Seja como for, agora o leite está derramado e cabe a Cairo seguir sua recuperação – são seis semanas para que o corpo volte ao estado 100% saudável (pelo menos essa é a prévia). Até lá, provável que nenhum time lhe procure. Mas ele tem um currículo consistente – tanto quanto Ryan Succop, kicker que ele substituiu em 2014. Que o destino dele seja o mesmo: encontrar vaga em outro time e que a carreira continue. Tudo indica para isso se ele ficar saudável.
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